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Tenho participado de uma brincadeira no Facebook: enumerar uma BD por dia até 2020. Começou há alguns meses, mas só agora dou-me ao trabalho de aqui a reproduzir. Mostro, hoje, as escolhas desta semana, com link na imagem para o texto que escrevi sobre o livro, ou um nhónhózinho, caso ainda não tenha falado dele.

Esta semana temos cinco sugestões para celebrar o filme do Joker (Sem A Piada Mortal do Moore e Bolland, porque essa é tão importante que nem vale a pena chover no molhado) e duas de leitura para todos os gostos e sensibilidades.

The Fade Out de Ed Brubaker e Sean Philips - G Floy

(repescamos esta nossa opinião de 2016, com muitas modificações)

Diz-se que somos a mistura do que pensamos de nós, do que os outros pensam de nós e do que nós pensamos que os outros pensam de nós. Eu prefiro antes dizer que a verdade sobre quem somos está escondida em histórias:  das que contamos sobre nós mesmos; das que os outros contam de nós; e das que construímos para ir de encontro às que contam sobre nós. 

O que vou lendo! - Criminal, Wrong Time, Wrong Place de Ed Brubaker e Sean Philips

Quando vi o quatro episódio da série de TV Westworld reconheci, entre os escritores, um nome: Ed Brubaker. Alguém que conheço de ler nas páginas da Banda Desenhada a escrever algo para além da 9.º Arte é sempre um prazer, principalmente para ele mas também para nós. Neste mundo do século XXI, da imagem em movimento, da informação digitalizada disponível em pequenos ecrãs que carregamos para todo o lado, neste mundo ascendem, por via desta tecnologia, novas artes ou, pelo menos, novas formas de abordar antigas artes. A série de TV transporta para o pequeno ecrã a narrativa, a capacidade de contar histórias, e a BD faz o mesmo, apenas com imagens estáticas. Quer uma quer outra arte são recentes, principalmente se as colocamos no contexto das anciãs e sempre eternas Prosa, Poesia, Dramaturgia. Contudo, gosto de pensar que são mais que complementos ou substituições, são evoluções, iterações de uma mesma intenção, a tal de contar uma história. Ed Brubaker faz parte dos contadores, dos trovadores, que manipulam a arte da narrativa e aplicam-na a diferentes meios. O curioso no caso deste autor (e em todos, se virmos bem as coisas) é não esquecer-se do passado, antes inspira-se nele e reproduz, nos dias de hoje, obsessões presentes desde sempre em várias artes. O escritor é um incontestável fã do noir, abordagem que já teve nomes e histórias sonantes ao seu serviço, a maior parte delas conhecidas de quem vê cinema ou aprecia histórias de detectives conturbados e violentos mas honrados.

Ed Brubaker e Sean Philips são colaboradores de longa data. O trabalho conjunto dura à décadas e é testemunho da sua total sincronia que o continuem a fazer sem perder qualidade. Criminal é uma série da editora Image onde ambos dão vazão à veia noir, expelindo pequenos contos de redenção e pecado (muitas vezes nesta ordem) que envolvem os mais diferentes protagonistas possíveis. Não existe padrão excepto o da tragédia do crime, o da repetição de padrões de destino. Os personagens são homens e mulheres conturbados, omissos à lei e à ordem, envolvidos em situações violentas e das quais a única solução implica empregar mais e mais violência. Não que Criminal seja o tipo de narrativa a sobejar testosterona. Antes falamos de violência rápida e incisiva, direccionada, pessoal, e, por isso, mais trágica. Depois, claro, Brubaker e Philips lidam com as consequências e causas dessa violência, principalmente por via dos seus personagens. 

Nos dois contos interligados deste Wrong Time, Wrong Place acompanhamos um pai e um filho. No primeiro conto, o progenitor terá de lidar como uma azarada incursão na prisão. No segundo é a vez do filho lidar com a vida criminosa do pai, na melhor das duas narrativas. Uma das curiosidades destas duas histórias é a introdução de BD's imaginadas ao estilo da década de 70 e que fazem lembrar outras como Conan, o Bárbaro e uma curiosa mistura de Master of Kung Fu e Homem-Aranha

Criminal  é sistematicamente uma das mais consistentes obras de qualidade a sair da imaginação de Brubaker e Philips. Este sétimo não é excepção. 

The Fade Out de Ed Brubaker e Sean Philips



Diz-se que o nosso verdadeiro eu é uma mistura do que nós pensamos de nós mesmos, do que os outros pensam de nós e do que nós pensamos que os outros pensam de nós. Eu prefiro as coisas ditas de outra forma. Que a verdade sobre o que nós somos está escondida por detrás de histórias: daquelas que nós contamos sobre nós mesmos; as histórias que os outros contam de nós; e, quem sabe, as histórias que construímos para satisfazer as outras histórias que contam sobre nós. Não possuímos uma memória infalível e nem sempre contamos a verdade. Os outros não conhecem cada pormenor da nossa experiência. Na lenta construção dessa "mentira" vai sendo contada uma História que acaba por solidificar-se na nossa vida passada e no nosso destino. Os gregos chamavam-lhe tragédia. Essa palavra acabou por evoluir para vários significados mas que sumarizam a existência de um caminho que parece traçado deste que nascemos. 

Os três actos de The Fade Out, continuação da já longa colaboração entre o escritor Ed Brubaker e o desenhador Sean Philips (juntos fizeram Seeker, Criminal, Fatale, et al), falam de histórias e de como elas acabam por tomar controlo da realidade, acabam por transformar-se na verdade. Sabemos que isso não é novidade, que a História é contada pelos vencedores, que por mais que queiramos perceber o que realmente ocorreu nada nunca será claro. O que é maravilhoso neste The Fade Out é a forma como Brubaker e Philips (perdoem-me o trocadilho) contam a história. Retrocedem no tempo, para uma época talhada à sua sensibilidade, os anos 40, os anos do noir, e deslocam-se no espaço para a industria do Cinema de Hollywood, para a sua Era de Ouro, a de Bogart, a de Bacall, a de Gable. Os protagonistas são dois homens, ambos escritores, uma actriz assassinada, uma outra actriz bem viva e um conjunto de figuras e personagens da industria que tentam construir uma mentira que ofusque a verdadeira face de uma arte que, na realidade, não existe. Quer dizer, o produto final, o filme, ele existe e é perene, mas para que se forme no ecrã é necessário construir toda uma tapeçaria de imagens e histórias falsas para que a ilusão, a magia e a eternidade do Cinema construam-se. Mentiras sobre mentiras sobre mentiras. Ou melhor, a verdade que fica.

Brubaker e Philips constroem um labirinto, este não em Creta mas em Hollywood, onde o Minotauro dificilmente é descoberto e onde o fio de Ariadne seria  a verdade mas não existe. Uma das melhores colaborações entre ambos, mesmo depois de tantas e tão boas. Uma história sobre histórias, de como um país, uma civilização, ergue a infraestrutura da sua História numa cama de histórias que nada correspondem à verdade. Um belíssimo livro em três actos. 

O que vou lendo! - As mulheres na Image - Velvet vol. 2, Lazarus vol. 3 e Ody-C vol. 1


A BD dos EUA é conhecida por ser a província do sexo masculino. Nunca percebi porque os criadores não se aventuravam mais. Seria medo do desconhecido? Não que não existissem mulheres como personagens, muito pelo contrário. Eram muitas e, geralmente, o interesse amoroso dos protagonistas. Existiam, sem dúvida, as super-heroínas mas, excepto por alguns exemplos, a sua presença (já para não falar de notoriedade) era a excepção e não a regra. Com o passar das décadas, a guerra foi sendo vencida batalha a batalha, criador a criador, até que, hoje em dia, não só vemos cada vez mais personagens femininas que não são estereótipos , como (dizem) que o número de leitoras está a aumentar e, finalmente, são em muito maior número os títulos por elas protagonizados. 

As editoras têm aderido a esta guerra e a Image, uma das mais interessantes e originais do panorama dos Comics, não é excepção. Falemos, por exemplo, destas três séries, todas de temáticas bem diferentes: Velvet centra-se no mundo da espionagem datada da década de 70; Lazarus lança-se num futuro pós-apocalíptico governado por famílias poderosas; Ody-C é uma reinterpretação da Odisseia de Homero, mas no espaço sideral e tendo como protagonistas apenas mulheres. Todas abraçam com naturalidade as protagonistas, sem agenda ou militantismo, apenas com a graciosidade da qualidade da história e do enredo.

Já falei neste blog das duas primeiras (vejam aqui e aqui) mas nunca é demais reiterar a qualidade de ambas. Os criadores envolvidos ficaram bastante conhecidos por trabalhos na Marvel e DC e decidiram-se pelo salto para a produção independente, escolhendo a Image. Os tiques e gostos que os haviam transformado como escolha natural para certos personagens nas duas grandes editoras são reaproveitados para a criação de personagens e histórias suas e adaptadas ao talento de todos. Brubaker e Epting já tinham conseguido uma simbiose na exploração do tema de espionagem no Capitão América. Com Velvet voltam a integrar o gosto do primeiro por estas narrativas e os desenhos do segundo, que não deixando de estar adaptado à atmosfera noir requerida, são também realistas o suficiente para não afastar os leitores pelo excesso de estética. Por seu lado, Lazarus de Rucka e Lark, tende para a prosa militarista e directa do primeiro, à qual se adapta o traço de Lark, realista, virtuoso, sem excessos e com fluidez narrativa. As histórias de ambas as séries continuam fortes, quer em termos de valor de entretenimento, quer de reflexão. Provas de que é possível  produzir nos EUA mais BD do que apenas super-heróis.

Finalmente, o OVNI que é Ody-C de Fraction, escritor, e Ward, desenhador. O último já tinha tido uma colaboração muito interessante em Infinite Vacation e com Matt Fraction, conhecido por uma prosa rebuscada e, por vezes, surreal, volta a enveredar pelo caminho do estranho. O estilo de Ody-C não é exactamente uma estética que me agrade, mas a reinterpretação que faz da Odisseia  acaba por ser um mote de entrada que é recompensador para quem conhece, mesmo que superficialmente, esse livro fundador. Ulisses (ou Odisseu) é um mulher, tal como os tripulantes, tal como os deuses do Olimpo. É um livro com o qual não me identifiquei particularmente mas que, acredito, apele ao gosto de muitos já que o trabalho dos dois criadores é diferente e apelativo. Acredito que deva ser lido.

O que vou lendo! - The Fade Out vol. 1 e Astro City, Private Lives




The Fade Out vol. 1 de Ed Brubaker e Sean Philips e Astro City, Private Lives de Kurt Busiek e Brent Andrerson

Estas duas BD têm, tematicamente, muito pouco em comum. A primeira é a mais recente incursão dos dois autores no universo noir de que tanto gostam (leiam sobre a sua colaboração em Fatale). O segundo é a continuação das histórias do universo de super-heróis criado por estes dois autores e por Alex Ross. Ambas têm abordagens completamente diferentes. Fade Out é uma análise cínica e negra (mas não desapaixonada) de Hollywood nos seus tempos áureos, onde a estrelas eram tão brilhantes quanto escuros eram os bastidores. Astro City verte amor por por todos os poros, uma carta longa, rebuscada e verdadeiramente apaixonada aos universos maiores que a vida dos super-heróis. Contudo, têm também muito em comum. Os quatro autores agarram nas suas paixões e, libertos de prisões, explanam toda a sua arte na concepção de universos e de estilos com os quais estão tão à vontade quanto pássaros a voar. Esta metáfora é, a meu ver, bastante apropriada. Quando deixam os criadores pensarem dentro das suas próprias inclinações e gostos, estes conseguem colocar cá fora o melhor que a sua capacidade criativa tem para oferecer.  Uma verdade tão simples e tão difícil de entender por alguns. Uma realidade que deveria ser lugar comum na maior parte da demanda artística e que, muitas vezes, é colocada de parte. Mesmo em trabalhos por encomenda, essa capacidade, esse engenho, não deveria ser curvado. Por observação ao longo dos anos, quando deixam o artista dar vôo à sua imaginação muitas são as vezes em que somos recompensados com obras melhores e, quando a sorte e o destino para isso se conspiram, maiores.

Depois desta conversa estarão à espera que não tenha outra coisa que rasgados elogios a estes dois livros. O prazer que ambos me deram ao lê-los pouco ou nada tem a ver com esta opinião. Se gosto mais ou menos é um problema exclusivamente meu, do que eu procuro numa obra. Tanto Fade Out como Astro City são dois bons exemplos do trabalho conjunto destas duas parelhas. No caso da primeira, Brubaker e Philips, cuja colaboração é já longa, é mais um exemplo do que as inclinações noir de ambos têm para oferecer. Desta vez não temos apenas detectives ou mulheres fatais "Cthulhianas" mas uma exploração do submundo de uma das artes que mais explorou o filão do noir: o cinema. A história começa com um assassínio, como não poderia deixar de ser, e imiscui-se nos meandros dos escritores, produtores, realizadores, da 7.º Arte. 

Astro City, Private Lives, é o mais recente volume da já antiga construção que Busiek, Anderson e Ross fazem de um mundo que mistura os arquétipos da Marvel e DC com a visão de deslumbramento ou horror do homem comum quando confrontado com estes universos de super-heróis. A "fórmula" continua a funcionar, se bem que neste conjunto de seis historias nem todas tenham a mesma força - todas contribuem para a macro-história que se está a construir desde o início desta nova série pela Vertigo. Apesar de continuar o deslumbramento, Busiek e companhia têm de tal forma nos habituado à excelência que qualquer coisa um pouco inferior sabe a pouco. Este volume apesar de ser superior à maior parte do que se produz em termos de super-heróis sabe a pouco.

Coleção Levoir/Público Marvel 2014 – 20.º Volume: Vingadores e X-Men parte II

(Prometo informar os menos conhecedores acerca da acessibilidade desta coleção de BD, ou seja, se é fácil ou não ler sem saber mais coisas)

Grau de acessibilidade: Difícil mas…

Sai amanhã, Quinta-feira, dia 20 de Novembro, junto com Público e custa 8,9€


Quando os heróis já enfrentaram por diversas vezes os seus habituais inimigos fica difícil inovar. Ao mesmo tempo, uma das histórias com quase tanta barba quanto a do aparecimento do super-herói é a do confronto entre dois ou mais super-heróis. Quantas e quantas vezes o Super-Homem encontrava-se com, por exemplo, o Capitão Marvel (não sabem quem é? Para o efeito, não interessa), e a primeira reação de ambos era a de desentendimento, seguida do confronto e, só depois, da junção para enfrentar o verdadeiro problema, geralmente um super-vilão. Existe um lado muito atraente para os fãs em ver personagens que são geralmente aliados a lutarem um contra o outro. Não só ajuda a responder à juvenil pergunta de “quem é o mais forte?” como possui uma carga dramática verdadeiramente cativante.

A editora Marvel, nos últimos 10 anos, tem levado este confronto para um lado inesperado, não se cingido aos eventuais desentendimentos mas indo mais longe, para o lado das diferenças filosóficas entre heróis. Este rol de encontros começou com Dinastia M, onde os Vingadores estavam de um lado diferente do dos X-Men. Continuou, desta vez só com os Vingadores, com a Guerra Civil (ambas estas histórias foram publicadas pela Levoir) e com as consequências da mesma – e que, ao que parece, serão adaptadas no terceiro filme do Capitão América, já que a base da titular guerra era a do confronto entre o Sentinela da Liberdade e o seu colega Vingador, o Homem de Ferro. Alguns anos e muitas histórias e sagas depois, eis que surge um confronto paradoxal mas esperado entre duas das maiores equipas da Marvel. Esta é a história que imediatamente antecede as publicadas nas revistas mensais da Panini Portugal, nomeadamente as dos Vingadores e dos X-Men, e funciona como importante complemento para perceber o ponto onde se encontra, principalmente, a equipa de mutantes.

São vários os escritores e desenhistas que trabalharam nesta saga, que sofre de vários defeitos, ainda que tenha importantes virtudes. Algo pelo qual não tenho particular afinidade é exatamente o facto de ser trabalhada por vários autores que, ainda que detentores de enorme talento, acabam por contribuir para um todo incoerente – cheira ao trabalho de encomenda que na realidade é. Por outro lado, é o culminar de uma multitude de outras histórias vindas de outros volumes (como Dinastia M), obrigando a um enciclopédico conhecimento dos meandros em que estes estes personagens se movimentaram na última década. Não que isso não deva funcionar como detrimento, como aliás sempre digo no final de cada um destes posts. Por outro lado, as vantagens residem nas mesmas características que são também defeitos. Não só estamos defronte do trabalho de alguns dos mais interessantes escritores e desenhistas de BD de super-heróis, como muita da magia da mitologia dos personagens reside no conturbado historial que os rodeia. Em suma, uma maneira curiosa de culminar esta coleção da Marvel de 2014: não com um Fim mas sim com um Continua…

Nota final – Eu não partilho da opinião que se tem de saber tudo para acompanhar bem uma história. Parte da “magia” da BD americana reside na descoberta posterior, na paciente reconstrução do puzzle. Mas para aqueles que não têm tempo e paciência aqui fica este meu pequeno esforço.


Coleção Levoir/Público Marvel 2014 – 19.º Volume: Vingadores e X-Men parte I

(Prometo informar os menos conhecedores acerca da acessibilidade desta coleção de BD, ou seja, se é fácil ou não ler sem saber mais coisas)

Grau de acessibilidade: Difícil mas…

Sai amanhã, Quinta-feira, dia 13 de Novembro, junto com Público e custa 8,9€


Quando os heróis já enfrentaram por diversas vezes os seus habituais inimigos fica difícil inovar. Ao mesmo tempo, uma das histórias com quase tanta barba quanto a do aparecimento do super-herói é a do confronto entre dois ou mais super-heróis. Quantas e quantas vezes o Super-Homem encontrava-se com, por exemplo, o Capitão Marvel (não sabem quem é? Para o efeito, não interessa), e a primeira reação de ambos era a de desentendimento, seguida do confronto e, só depois, da junção para enfrentar o verdadeiro problema, geralmente um super-vilão. Existe um lado muito atraente para os fãs em ver personagens que são geralmente aliados a lutarem um contra o outro. Não só ajuda a responder à juvenil pergunta de “quem é o mais forte?” como possui uma carga dramática verdadeiramente cativante.

A editora Marvel, nos últimos 10 anos, tem levado este confronto para um lado inesperado, não se cingido aos eventuais desentendimentos mas indo mais longe, para o lado das diferenças filosóficas entre heróis. Este rol de encontros começou com Dinastia M, onde os Vingadores estavam de um lado diferente do dos X-Men. Continuou, desta vez só com os Vingadores, com a Guerra Civil (ambas estas histórias foram publicadas pela Levoir) e com as consequências da mesma – e que, ao que parece, serão adaptadas no terceiro filme do Capitão América, já que a base da titular guerra era a do confronto entre o Sentinela da Liberdade e o seu colega Vingador, o Homem de Ferro. Alguns anos e muitas histórias e sagas depois, eis que surge um confronto paradoxal mas esperado entre duas das maiores equipas da Marvel. Esta é a história que imediatamente antecede as publicadas nas revistas mensais da Panini Portugal, nomeadamente as dos Vingadores e dos X-Men, e funciona como importante complemento para perceber o ponto onde se encontra, principalmente, a equipa de mutantes.

São vários os escritores e desenhistas que trabalharam nesta saga, que sofre de vários defeitos, ainda que tenha importantes virtudes. Algo pelo qual não tenho particular afinidade é exatamente o facto de ser trabalhada por vários autores que, ainda que detentores de enorme talento, acabam por contribuir para um todo incoerente – cheira ao trabalho de encomenda que na realidade é. Por outro lado, é o culminar de uma multitude de outras histórias vindas de outros volumes (como Dinastia M), obrigando a um enciclopédico conhecimento dos meandros em que estes estes personagens se movimentaram na última década. Não que isso não deva funcionar como detrimento, como aliás sempre digo no final de cada um destes posts. Por outro lado, as vantagens residem nas mesmas características que são também defeitos. Não só estamos defronte do trabalho de alguns dos mais interessantes escritores e desenhistas de BD de super-heróis, como muita da magia da mitologia dos personagens reside no conturbado historial que os rodeia. Em suma, uma maneira curiosa de culminar esta coleção da Marvel de 2014: não com um Fim mas sim com um Continua…


Nota final – Eu não partilho da opinião que se tem de saber tudo para acompanhar bem uma história. Parte da “magia” da BD americana reside na descoberta posterior, na paciente reconstrução do puzzle. Mas para aqueles que não têm tempo e paciência aqui fica este meu pequeno esforço.

Fatale da editora G Floy

Ao mesmo tempo que as BD Saga e Tony Chu, saiu ontem na Amadora BD a versão em português da excelente Fatale de Ed Brubaker e de Sean Philips. Da mesma maneira que já tinha falado neste Blog das duas obras já anunciadas, também já aqui dediquei umas quantas palavras a esta mais recente colaboração entre os dois artistas, parceria que dura há já muitos anos e muitas obras. Dêem uma olhada pelas etiquetas deste post e descubram outras coisas que escrevi sobre ambos.

Esta obra terá um total de cinco volumes, tendo o último sido publicado este mês nos EUA.





O que vou Lendo! - Velvet vol. 1 de Ed Brubaker e Steve Epting

A equipa de Ed Brubaker, escritor, e Steve Epting, desenhista, foi bastante aplaudida pelo trabalho que fizeram no Capitão América. Recentemente, a editora Levoir, junto com o jornal o Público, abriu a sua coleção da Marvel de 2014 com dois volumes que compilavam a primeira história destes criadores no personagem, O Soldado de Inverno. Seria tão bem recebida que inspirou o argumento do mais recente filme do Sentinela da Liberdade. Na BD, a colaboração entre os dois acabaria de uma forma bastante dramática, nomeadamente com a mediática morte do Capitão

Os anos passaram e a reunião entre estes dois talentosos senhores parecia fadada a não acontecer mais. Eis que surge o convite da editora independente Image, actualmente o reduto de algumas das mais interessantes obras da 9.ª Arte nos EUA, e decidem avançar com um projecto totalmente detido por ambos. Brubaker não é novo nas andanças da publicação independente, tendo já produzido maravilhosas peças como Fatale e Criminal, mas Epting até o momento era conhecido por décadas de trabalho em personagens da Marvel

Velvet conta-nos a história de uma agente secreta em meia-idade envolvida em conspirações tipicamente "James Bondianas". Todas as roupagens da espionagem pura e dura, de agentes duplos, triplos e outras iterações, de situações que envolvem traições e de traições em cima dessas mesmas traições,  tudo está presente neste Velvet, orquestrado na perfeição pelas habilidosas palavras do contido Brubaker e pelo ambiente soturno de Epting. Ambos oferecem um tour-de-force em como fazer uma história contendo todos  os lugares comuns das grandes obras de espionagem mas reinventados e reimaginados por talentos superiores. 

O facto de escolherem um época de ouro para este tipo de conto, o início da década de 70, é um dos golpes de génio da série. Ao afastarem-se da tecnologia Orweliana que parece ser lugar comum nos dias de hoje, ao escolherem uma época onde tudo é ainda materializado, oferece a história e personagem a situações que vão muito ao encontro do imaginário que construímos. O Cinema, a arte por excelência onde este tipo de histórias mais chegaram ao publico comum (no qual me incluo), geralmente afasta-se do passado para este tipo de tema. A BD, tal como a Prosa, pode e muitas vezes escolhe outros caminhos, preferindo a familiaridade e, por conseguinte, um ambiente idealizado que ajuda à projeção.  Velvet é isso: familiar e perigoso. Uma pitada de retro num cozinhado de ingredientes desconhecidos. 

O suspense e o mistério, essenciais ao tema da espionagem e contra-espionagem, são geridos de forma parcimoniosa e nunca gratuita, respirando através do desenvolvimento das variadas personalidades que formam o quadro da série. A escolha de uma mulher em meia-idade como personagem principal  funciona bem como premissa em Velvet, afastando-se, assim, de um conjunto de lugares-comuns geralmente associados a uma literatura mais escapista. Contudo, a identificação torna-se também imediata e fácil, porque abre espaço para fraquezas e forças que não estão muitas vezes presentes nestes universos. Além disso, poderá atrair um público alvo geralmente dissociado da BD. 

Uma aposta mais do que ganha, primeiro dos autores e depois da Image.

O que vou lendo! - Lazarus vol. 1 e 2 de Greg Rucka e Michael Lark



A editora de BD Image continua a conseguir aliciar alguns dos maiores nomes da atualidade artística da 9.ª Arte para publicar sob a sua égide. Quem perdem são as grandes, DC Comics e Marvel, e quem ganham são os leitores e, acima de tudo, a Banda Desenhada. Dados rédea solta, estes criadores estão a poder fazer aquilo que sabem fazer melhor, escrever e desenhar as suas melhores histórias, colocar para fora tudo o que há ainda por dizer.

Greg Rucka e Michael Lark são dois artistas conhecidos por trabalhos não só nas grandes da BD americana como por alguns projetos paralelos pessoais. Trabalharam em personagens tão conhecidos como Mulher-Maravilha, Wolverine, Demolidor, Batman, etc., mas também em produções independentes como Queen & Country e Whiteout. Trabalharam juntos na lendária Gotham Central, série passada na cidade ficcional do Batman, colaboração que lhes conferiu o estatuto de culto, e regressaram com este LazarusGotham Central contava ainda com a imprescindível colaboração de Ed Brubaker, conhecido por trabalhos no Demolidor, Criminal e Fatale .

A arte de ambos estes artistas oferece-se a uma conjugação perfeita de ambiente e estilo, militarismo misturado com noir. Não é portanto de estranhar que algo desta veia seja aquilo que aparece em Lazarus, uma série passada num futuro distópico, onde famílias governam a paisagem norte-americana, tendo-a dividida por coutadas. São essas mesmas famílias aquelas que dispensam “benesses” pelo resto da população, que vive em diferentes estados de escravatura, diferenciados apenas pela proximidade ou não dos benfeitores. O cenário metafórico construído é simples, eficaz e óbvio e, nas mãos de outros criadores (como aliás sempre o digo) poderia ser algo perfeitamente esquecível. Contudo, as idiossincrasias de ambos, principalmente as da escrita de Rucka, imbuem a história de uma certa forma de verdade que a tornam não só profunda como relacionável. O relacionamento que temos é essencialmente feito através da heroína, Forever, uma espécie de polícia/soldado de uma das famílias, mas também mais do que isso. Não só é filha do patriarca, como também foi aprimorada física e psicologicamente de modo a melhor levar a cabo as suas missões. Contudo, e como não poderia deixar de ser, possui um código moral que, aparentemente, é bastante diferente do do seu progenitor e irmãos, o que a levará a uma inevitável rota de colisão – ou pelo menos assim se espera. Pode parecer comida requentada mas não é.


Não sendo uma das mais originais premissas a surgir em tempos recentes é, contudo, uma mistura de outras que, conjugadas pela imaginação de Rucka e Lark criam um todo único e singular. 

Colecção Marvel Levoir/Público – 1.º Volume: Capitão América, Soldado de Inverno

(Prometo informar os menos conhecedores acerca da acessibilidade desta coleção de BD, ou seja, se é fácil ou não ler sem saber mais coisas)

Grau de acessibilidade: Razoável

Sai Quinta-Feira, dia 10 de Julho, junto com jornal Público e custa 4,90€


Não sou o primeiro nem serei o último a dizer que os últimos anos têm sido maravilhosos para a publicação de BD estrangeira em português do nosso Portugal. Especialmente a de super-heróis. Logo no seu início, este ano de 2014 foi testemunha de um marco: o regresso das publicações mensais pela Panini com os personagens da Marvel. Agora, a editora que começou tudo, a Levoir, associada ao jornal Público, volta a dar ar da sua graça, depois de um ano de 2013 exclusivamente dedicado à DC Comics, a distinta concorrente da Marvel.

Este regresso só poderia ser feito com o primeiro personagem a ter um filme lançado no corrente ano: o Capitão América. E, já agora, com a publicação da história que inspirou esta última obra cinematográfica: O Soldado do Inverno da dupla Ed Brubaker, na escrita, e Steve Epting, no desenho. Não são difíceis os elogios que se podem dar a esta obra. Foi um dos grandes marcos na carreira literária do personagem, que nem sempre se pautou por obras de importância significativa no panorama da BD americana. Teve alguns altos com as duplas Roger Stern/John Byrne e J.M. deMatteis/Mike Zeck na década de 80, Jack Kirby na de 70 e, claro, com o regresso à Marvel na década de 60 (não convém esquecer que o personagem remonta à década de 40). Contudo, fora estes pequenos picos, foi sempre um personagem que funcionava particularmente melhor como membro dos Vingadores, pela sua personalidade e presença, ou como fonte de inspiração para outros. Provavelmente será o meu ponto de vista que tolda esta análise, mas o facto de ser europeu a analisar um claro símbolo estado-unidense não a facilita de forma alguma. Ainda assim, na altura, os rasgados elogios que eram tecidos à tentativa de Brubaker/Epting  foram suficientes para que desse uma chance às histórias. O tempo não se deu por perdido e os capítulos que são colecionados nestes dois primeiros volumes desta coleção da Levoir constituem-se como um dos pontos altos da carreira quer do Capitão América, quer dos dois autores. 

Epting seria o principal desenhista durante dois anos da saga que Brubaker tinha orquestrada, saga esta que se esticaria para um total de sete anos. O estilo do escritor deveria muito ao ambiente típico dos thrillers de espionagem da década de 70, envolvendo espiões russos e conspirações transcontinentais. Tudo, claro, no palco maior que a vida dos super-heróis, com vilões tenebrosos como o absurdamente terrível Caveira Vermelha, eterno arquinimigo do sentinela da liberdade e resquício de uma época negra da história da humanidade, o Nazismo. Este Soldado do Inverno é exactamente isto tudo, uma incursão empolgante pelos meandros da espionagem e contra-espionagem típica deste imaginário.  Imperdível!


Captain America: Winter Soldier de Joe Russo e Anthony Russo (Capitão América: O Soldado do Inverno)

Eu gostava de poder dizer que adorei este filme. Infelizmente, não o posso. Justiça seja feita, também não posso afirmar que não atingiu totalmente as (elevadas) expectativas. Que estava tudo mal. Que não entreteu. Não é, de todo, verdade. Teve momentos bastante bons, entreteve, mas faltou, acima de tudo, alguma contenção por parte de quem escreveu a história.

Para quem entende destas coisas da BD, sabe que o titulo do filme vem do início de uma das mais elogiadas fases do herói, escrita por Ed Brubaker e desenhada por Steve Epting. O conjunto de histórias pelas quais estes dois autores ficariam conhecidos e que culminaram na muito mediática morte do personagem titular, iniciou-se exatamente com um volume chamado The Winter Soldier.  Ora é aqui que a coisa começa mal. Apesar de um ou outro pormenor ser fiel ao original, em muitos outros distancia-se. Antes que os que não são fãs comecem a pensar “Lá estão os cromos da BD!”, a minha critica não tem nada a ver com o afastamento em relação à obra. Nota-se o amor que é já apanágio de todos os filmes que vêm da Marvel. O mal vem de tentarem colocar histórias a mais, ficando um todo demasiadamente “ocupado”. Existem demasiadas coisas a acontecer, sem que muitos pormenores sejam devidamente explorados com calma e descontração. A meu ver, a história que dá titulo ao filme acaba por ser uma nota de pé de página. Tudo o resto que acontece é bastante mais importante – e obviamente que não o vou revelar aqui. Este excesso de bagagem acaba por prejudicar o filme, que fica sem um centro profundamente definido. Mesmo a mensagem central (segurança vs. liberdade) desaparece no meio da pirotecnia (sim, os efeitos especiais são abundantes... talvez demais), da grandiloquência e, uma vez mais, da história demasiadamente ocupada.

Ainda assim, existem momentos fortes no filme. Não apenas daqueles dedicados aos fãs, mas também para todos os restantes. Aparecem vários personagens da mitologia do Capitão América que são sempre deliciosos de ver na tela gigante. A Viúva Negra de Scarlett Johansson merece urgentemente um filme. A energia supranatural física do Capitão é muito bem explorada, mostrando claramente tratar-se de um ser num apogeu desconcertante para o comum dos mortais.


Em suma, um filme que entretém mas não deslumbra. Não como, para mim, aconteceu com o Thor e os Vingadores.