Dylan Dog, O Velho que Lê e Até que a Morte Vos Separe - G.Floy


Dylan Dog é uma personagem da editora italiana de BD, a Bonneli, criado em 1986 pelo escritor Tiziano Sclavi. É um dos grandes fenómenos da 9.ª Arte, principalmente na sua terra natal, mas não só. É amado pelos mais diferentes cantos da sociedade, e até intelectuais da craveira de Umberto Eco defendem-no de forma acirrada. Não é isso que faz a série ser melhor ou pior, mas é uma boa forma de começar um post sobre qualquer obra de BD - apelando ao desejo de aceitação por parte dos fãs da Arte Suprema (estão a ver como também o faço?). 


Existiram tentativas recentes de publicar a série em português de Portugal, todas da editora Levoir, sempre com a coordenação e colaboração de José Hartvig de Freitas - a cabeça por detrás da G Floy. O primeiro título, Mater Morbi, apareceu na colecção Novelas Gráficas III. Foi este o meu primeiro contacto com a personagem e, confesso, pouco memorável. A história era boa, a arte fabulosa, mas parecia algo que já tinha saboreado em outro restaurante qualquer. A impressão foi tão pouco entusiasmante que fiquei com pouca vontade de ler os títulos que saíram, também pela Levoir e no ano passado, na colecção Bonneli. Contudo, a sugestão perpétua de amigos (alguns dos quais envolvidos na edição destes dois novos títulos pela G Floy, inaugurando o selo Aleph) mereceu uma segunda vista de olhos - ajudou também o formato, tal como o preço, ambos convidativos. E ainda bem que assim foi, porque O Velho que Lê e Até que a Morte Vos Separe são dois dos melhores títulos que li este ano. Sem quaisquer reservas.

Percebo, agora, o fascínio com a personagem. Ambas as histórias revertem para o cerne de Dylan Dog, um investigador do paranormal de um universo surreal e onírico. A história segue uma linha que insiste em permanecer coesa, o que impressiona mais ainda pelo facto de, em mais do que um momento, inverter por estas duas vertentes narrativas, tão típicas de artistas como David Lynch ou Luis Buñuel. Ou seja, os autores não sacrificam a coesão aos pés da simbologia e do hermetismo. Mais impressionante ainda são as três histórias incluídas nestes dois títulos (duas longas e uma curta) serem de matrizes diferentes. A d'O Velho Que Lê, do autor Fabio Celoni, viaja por um mundo de sonhos, abordando uma história de amor e de obsessões. Nesse mesmo volume está também incluída talvez a melhor história das três, escrita pelo criador Tiziano Sclavi e desenhada por Angelo StanoA Pequena Biblioteca de Babel é um delicioso conto macabro cheio de humor negro que parece ser uma das imagens de marca de Sclavi. Por seu lado, Até que a Morte Vos Separe de Mauro Marcheselli,  Tiziano Scalvi e Bruno Brindisi mistura realismo e fantasia de forma orgânica, enquanto explora o passado romântico da personagem titular.

As histórias destes dois volumes navegam a ténue fronteira entre o entretimento e a maturidade estilística e temática, sem perder o rumo. Quer fossem como eu, que não se sentira inicialmente atraído pela personagem, quer sejam antigos fãs, têm, nestes dois volumes, boas razões para ficar como Umberto Eco. Agora sim, as suas palavras fazem sentido: "posso ler A Bíblia, Homero e Dylan Dog sem nunca sentir-me enfadado".

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