Os conhecedores da
mitologia sabem perfeitamente que ler qualquer história protagonizada pelos X-Men ou outro dos personagens derivados
é um exercício complicado. Desde que foram reiniciados em meados da década de
70, e, especialmente, desde que passaram a ser escritos por Chris Claremont, que
o universo cresceu para dimensões inacreditáveis e os enredos tornaram-se
labirínticos – isto junto com parceiros de crime como John Byrne, Dave Cockrum,
Paul Smith, et al. Durante mais de 17 anos o escritor construir um mundo de tal
forma complexo que o mais desavisado ou casual dos leitores terá uma tarefa hercúlea
se quiser entrar neste mundo.
Uns anos depois de
os X-Men serem já um valor seguro,
Claremont experimentou com a fórmula e criou uma equipa de mutantes
adolescentes a quem deu o “imaginativo” nome de Novos Mutantes. Não só capitalizava na fama do grupo principal como
também nos Novos Titãs da Distinta
Concorrência (A DC, perceberam?), outros dos valores seguros de venda no início
da década de 80. Nasciam um grupo de cinco jovens mutantes: Danni Moonstar, a
nativo-americana conhecida por Mirage; Rahne Sinclair, a escocesa e lupina
Wolfsbane; Sam Guhtrie, rapaz all-american,
o Cannonball; Roberto da Costa, brasileiro, o Sunspot; e Xian Coy Mahn,
vietnamita de cognome Karma. Durante quase cinco anos, 54 capítulos e mais umas
coisas aqui e acolá, Claremont imprimiu o seu muito particular carimbo num
grupo de jovens que se portavam de acordo com a idade, isto enquanto lidavam
com o facto de fazerem parte de uma raça ostracizada pelo resto da sociedade e,
já agora, com sombrios inimigos. Os oito volumes que acabei de ler englobam a
totalidade deste trabalho.
Os primeiros
volumes desta coleção são, sem dúvida, os mais fortes. Nos dois últimos já se nota
algum esforço em ir ao encontro da fabulosa tour
de force que foi o princípio. Com a ajuda de desenhistas de primeira água
como Bob McLeod, Sal Buscema, Bill Sienkiewicz, Arthur Adams, apenas para citar
os mais fortes, assistiu-se a um dos mais imaginativos “world-building” que a editora de BD Marvel teve o prazer de incluir nos seus anais. Especialmente nos
três primeiros volumes, somos bombardeados com novos conceitos atrás de novos conceitos,
introduzindo mundos, personagens e enredos a uma velocidade estonteante: Nova
Roma; Urso Demônio; Legião, o filho do Professor Xavier; Hellions; etc. Quase
que me arrisco a dizer que este foi o último “world-building” desta magnitude a acontecer na Marvel. Desde então a editora e os seus criadores limitam-se a
jogar com os brinquedos que homens como Claremont, Lee, Kirby, Ditko, Starlin,
etc., tiveram a ingenuidade de criar para um patrão que lhe ficou com os
dividendos do trabalho.
Foi especialmente
gratificante ler no original a lendária colaboração Claremont/ Sienkiewicz, um
dos pontos altos da BD mainstream nos
EUA. Muito dificilmente voltamos a ver um escritor tão comercial a trabalhar de
forma tão produtiva com um desenhista de margem do gabarito deste. Os
conturbados argumentos de Claremont eram imediatamente colocados num outro
nível quando o muito pouco “realista” traço de Sienkiewicz tornava físicas as
palavras do primeiro, de uma forma que devia mais ao onirismo que ao fantástico
típico do mundo dos super-heróis.
Outras das mais interessantes
colaborações ocorrem nas aventuras Asgardianas
dos Novos Mutantes (sim, o mundo
mítico de Thor), com o traço e
imaginação de Arthur Adams. Este é um dos momentos altos da imaginação do
escritor, que mistura os dilemas existenciais do universo Mutante com a
mitologia de Asgard, uma combinação
estranha mas com resultados deliciosos. É pena que o trabalho de coloração nestes
volumes seja o original, porque o traço de Adams necessita urgentemente de um esforço
muito melhor.
Também foram muitos
os parceiros a juntar-se à luta dos cinco originais; Magma; Warlock; Cypher; e
Illyana Rasputin, Magik, irmã do X-Man Colossus e estrela da única minissérie paralela feita por Claremont,
e que contava a história do personagem antes de se juntar aos Novos Mutantes. Uma história que, a meu
saber, nunca foi publicada em Portugal. Sim, porque estas aventuras foram quase
todas lançadas pela saudosa editora brasileira Abril, nos seus saudosos formatinhos. Reler foi, obviamente, um
prazer nostálgico, mas não seria nada de extraordinário se a qualidade não
estivesse de acordo com esse peso. Conseguiram sobreviver com o passar dos anos,
isso posso vos garantir, e ganham muito em folhear estas páginas na sua língua
original. Sem divida para fãs e, espero, não só.
Sem comentários:
Enviar um comentário