Guerra dos Tronos: com 10 minutos assim...


Como seria de esperar para quem lê este Blog, a probabilidade de eu ser fã da série de TV Guerra dos Tronos era elevada. Para que as minhas credenciais geek fiquem totalmente carimbadas, fui primeiro fã dos livros. Já sabia da existência d'As Crónicas de Gelo e Fogo de George R. R. Martin antes da publicação, em 2007, do primeiro volume pela Saída de Emergência, mas foi com esta editora que comecei a devorá-los (leiam aqui o que escrevi à altura, com ainda menos qualidade de escrita e um gosto imberbe pela obra).

Sou daqueles que preferia que Martin tivesse acabado esta obra e não estivesse a "lê-la" na série de TV. Contudo, com a qualidade que tem demonstrado, é uma irritação mínima (mas não totalmente apagada). Mas imaginem como se sentem os que começaram a ler as aventuras de Tyrion, Daenerys, Jon Snow, etc., quando o escritor publicou o primeiro volume da saga em 1996. Vinte anos depois ainda não sabem do fim da história e vão descobri-lo numa série de TV.

Sim, o episódio quatro da sétima temporada, agora em exibição, foi maravilhoso e empolgante. Principalmente os últimos dez minutos, os da batalha entre as forças (a partir de agora há spoilers, portanto, fujam os que ainda não viram o episódio) de Daenerys e de Jamie/Cersei Lannister. Dez minutos em que era impossível não estar sentado na beira do sofá enquanto o coração batia a mil, preocupado com o destino das muitas personagens que aprendemos a adorar ao longo destes anos todos. Um verdadeiro testamento à qualidade da escrita de Martin e dos que fazem a série de TV.

Houve o glorioso uso de Drogon, o gigantesco dragão de Daenerys, cuja chama incandescente varria o exército de Jaime Lannister. Houve a batalha sangrenta e incrivelmente violenta, como raramente aparece no Cinema e muito menos na TV. Houve a pirotecnia e o soberbo uso de efeitos especiais. Mas houve muito mais que isso e finalmente chego ao que vos quero dizer.

A cena começa nos diferentes diálogos de Jaime e Bronn com outros personagens mas principalmente com o jovem cavaleiro Dickon. A troca de palavras centra-se no facto da guerra não ter nada de glorioso, ao contrário do que professam os contos de cavalaria e a gabarolice dos cavaleiros (tema recorrente em George Martin). Falam do facto de Dickon ter morto ou visto morrer companheiros de caçada, outra característica inglória e desonrosa da guerra e da luta pelo poder. Estas afirmações sublinham a ideia de ausência de maniqueísmo simplista na narrativa de Martin, onde existem pessoas completas e ambivalentes em ambos os lados. A conversa funciona como prelúdio ao que se seguiria.

O escritor (ou escritores) tem realizado um extraordinário trabalho para que leitores e telespectadores estivessem preparados para empatizar com os dois lados desta batalha. Podemos roer as unhas em cada momento, num duelo esperança/receio de que alguém sairia morto no final (não esquecer que Martin tem feito gala de que "nenhuma personagem está a salvo", aumentando o nosso nível de ansiedade). Por um lado, queremos que Daenerys vença, que Drogon faça terra queimada do campo de batalha, mas por outro não queremos que Jaime ou Bronn sejam sacrificados (nem o dragão, já agora, que esteve perto de morrer).

O rosto e olhar de Tyrion são um espelho desta realidade. Preocupa-se ao mesmo tempo com o irmão e com Daenerys. Esse olhar espelhava a dicotomia que sentia ao ver uma batalha terrivelmente sangrenta. Pessoas calcinadas e nada mais que cinzas sopradas pelo vento. Violência desmedida. Não há glória ou honra nas batalhas e na guerra. Só nos contos delas. Guerra é inevitável. Honra e Glória é apenas para os que a tentam vender aos desgraçados que dão o corpo por ela. 

Jaime, por seu lado, prova que evoluiu como pessoa desde o primeiro episódio. Não abandona a batalha e quase (?) que dá a vida pela vitória e pelos companheiros de batalha. Faz lembrar o comentário da Diana (a Mulher-Maravilha) aos generais ingleses da 1.ª Guerra: que os verdadeiros generais estão junto com os seus soldados e não refugiados na distância e conforto das salas de mapas.

Dez brilhantes minutos que gritam bem alto pela qualidade da escrita, pela realização, pela alma e pelo planeamento desta obra. Aplausos de pé!

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