Este post é um pouco preguiçoso. Já aqui falei dos 11 capítulos que formam esta compilação de capa dura e maior formato. Contudo, a qualidade da história que o escritor Jason Aaron começou a contar exactamente nestas páginas justifica (a meu ver) uma segunda visita. A visão que tem para Thor ainda não foi totalmente descortinada, e até essa descoberta teremos sempre de refrear se não o entusiasmo pelo menos o juízo final. Se tomarmos apenas como exemplo estes primeiros capítulos poderemos ter em mãos uma das mais emblemáticas sagas do Deus do Trovão. Ou, se calhar, sou só eu. O tempo o dirá. Assim sendo, se tiveram paciência reponho abaixo os dois posts que escrevi sobre estes tais 11 capítulos, antes coleccionados em dois livros e agora compilados num único. É que ler neste maior formato é como ver um filme (qualquer filme, não só os de "acção") num ecrã gigante. Sabe a repasto e não a uma ida ao centro comercial.
Primeira parte
De vez em quando gosto de pensar que existem dois tipos de leitores no que respeita a BD de super-heróis: os que gostam do Super-Homem e os que inclinam-se para o Batman. Uns preferem seres maiores que a vida, dotados de poderes divinos, envolvidos em situações onde, permanentemente, o destino da realidade é posto em causa - estes são os do Super-Homem. Os de outra qualidade preferem heróis realistas, que poderiam existir no nosso mundo e que, diariamente, travam uma luta desesperada e trágica contra o cinza do crime nas cidades - estas são as do Batman. Antes de continuar, os fãs de BD que me perdoem a excessiva compartimentalização. Obviamente que a apreciação da arte não passa por este preto e branco excessivo. Mas, ainda assim, existe aqui algo de verdade.
No que me toca, sempre pendi mais para o lado do Super-Homem e o Thor, livro e personagem que me trouxeram a este post, tende claramente para o lado cósmico do arquétipo do super-herói. Neste sentido, este primeiro volume do trabalho de Jason Aaron e Esad Ribic é um soberbo exemplar da capacidade que a BD tem em superar os limites da Prosa e do Cinema e contar uma história verdadeiramente cósmica em escala, linguagem e alcance. O enredo atravessa o tempo e o espaço, focando-se em três épocas da vida do Deus do Trovão enquanto este confronta um ser demoníaco e hiper-poderoso cujo objectivo é claro no título do livro: exterminar todos os panteões de deuses do universo. Ênfase em universo. Pela primeira vez (pelo menos tanto quanto é do meu conhecimento) aparecem nas páginas do personagem outros panteões que não apenas os terrenos. Aaron delicia-se em criar múltiplos deuses, espalhados pelos cantos do cosmo e alvo da adoração de uma multitude de povos alienígenas. Para completar o quadro, a linguagem tipicamente visceral que costuma aplicar aos seus diálogos e exposições é aplicada a longos momentos de exploração cosmogónica. Existe prazer nesta descoberta, particularmente deliciosa para quem o lê, tendo em consideração outras obras mais "urbanas" que caracterizaram anteriores explorações do autor (portanto, estilo Batman): Wolverine e Punisher, por exemplo. A aproximação rude que Aaron faz aos personagens, que geralmente são duros e másculos, aplica-se na perfeição a Thor, que podemos ver como o guerreiro definitivo. De facto, existe no personagem e no autor uma salutar combinação, como se ambos tivessem destinados em se encontrar. Visceralidade misturada com Divindade, à boa maneira do povo que adorava Thor, os Vikings.
Segunda parte
Godbomb completa, de forma verdadeiramente épica, os eventos que começaram nos primeiros capítulos. A batalha final de três versões do Deus do Trovão, uma do passado, outra do presente e uma do longínquo futuro, contra o "Chacinador de Deuses", desenrola-se no palco mais que apropriado para estas mitologias: o cósmico. Toda a grandiloqüência de combates maiores que a vida, toda a fúria tonitruante, todo o poder titânico, foi concentrado pelas palavras de Aaron e pela arte de Ribic em onze capítulos que, muito sinceramente, já vigoram (no que a mim diz respeito) nos melhores contos de Thor.
Muito raramente uma voz poderia colar tão bem com as palavras e ações de um personagem. Aaron é perfeito para Thor e para o seu universo, misturando masculinidade, belicismo medieval, orgias, bebedeiras e combates, num cozinhado de puro entretenimento. Ao mesmo tempo, mistura uns pós de reflexão suave que constroem um conto que vai para além dos limites do filme-pipoca. Ribic, por seu lado, com desenho limpo e cenários mitológicos, é a escolha acertada para o escritor e personagem.
Agora que já se prepara o terceiro filme protagonizado por Thor, inspirado na lenda Viking de Ragnarok, o crepúsculo dos deuses, tenho uma sugestão a fazer. Quando estiverem a pensar no quarto filme das aventuras do Deus do Trovão na 7.ª Arte, não vão muito mais longe que estes primeiros onze capítulos do trabalho de Jason Aaron. Tudo é perfeito para o cinema: uma história direta e pouco alicerçada na complicada continuidade do personagem; cenários maiores que a vida; combates épicos; um vilão tenebroso. Não mudem as palavras, não medem quase nada. Não vale a pena. Aaron e Ribic já fizeram o trabalho mais difícil. É só copiar e não estragar.
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