Colecção Marvel Levoir/Público – 3.º Volume: Homem-Aranha, A Última Caçada de Kraven

(Prometo informar os menos conhecedores acerca da acessibilidade desta coleção de BD, ou seja, se é fácil ou não ler sem saber mais coisas)

Grau de acessibilidade: Razoável

Sai Quinta-Feira, dia 24 de Julho, junto com jornal Público e custa 8,90€



Todos já devem ter ouvido falar do Homem-Aranha. Do tímido rapaz, Peter Parker, que mordido por uma ranha radioactiva transforma-se num super-herói. Mas não num super-herói qualquer. Num super-herói com problemas comuns: pagar a renda; arranjar aquele medicamento caro para a tia doente; conseguir entregar a fotografia que lhe permita levantar o cheque, ao mesmo tempo que faz a última rodada de exames do semestre e enfrenta o Dr. Octopus - bem, este último talvez não seja um problema mundano.  A fórmula era, à altura, tão inovadora que se transformou num dos maiores arquétipos da mitologia dos super-heróis. E perdurou nos anos. Décadas de criadores teceram histórias atrás de histórias que, de uma forma ou de outra, iam repetindo a maravilhosa obra de Stan Lee e Steve Ditko. Raras foram as incursões mais sombrias num personagem que, apesar dos pesares, era solarengo e optimista. Umas dessas incursões é esta, A Última Caçada de Kraven de J. M. DeMatteis e Mike Zeck.

A década de 80 foi pródiga em reinterpretações adultas e negras dos personagens que, durante muitas décadas, foram geralmente alvo de aventuras relativamente leves, se não tanto no conteúdo, pelo menos na forma - claro que com excepções, uma delas sendo mesmo o Homem-Aranha, que teve sempre uma forte carga trágica associada ao personagem. Aliás, a morte de uma das suas namoradas na década de 70 marca, para muitos, o fim de uma era mais inocente na BD americana. Mas adiante. Com obras como The Dark Knight Returns e Watchmen na DC Comics a transformar para sempre a mitologia dos super-heróis, a Marvel não quis ficar para trás e, numa combinação de factores, consegue atrair um dos mais adultos e complexos escritores, J. M. DeMatteis (curiosamente também o autor da BD cómica com a Liga da Justiça, também desta época), que teceu uma das mais emblemáticas e memoráveis histórias do Homem-Aranha.

A abordagem de DeMatteis é tudo. A escrita dá um salto quântico em complexidade e qualidade, como muito pouca vezes tinha acontecido até então em outras BD e nunca nas do Homem-Aranha.   A abordagem poética na escrita, os diálogos psicologicamente reveladores, a análise profunda das motivações dos personagens, são aproveitados ao máximo pelo trabalho do escritor, que esculpe tridimensionalidade  em criações que, até então, pouco mais eram que clichés. Falo especialmente dos vilões da história, Kraven e Vermin, mas também do protagonista, Peter Parker (obviamente que o Homem-Aranha não era um cliché, nem tampouco mal desenvolvido). Imagine-se a pedra no charco no universo mainstream do Homem-Aranha que terá sido este A Última Caçada de Kraven. Aliás, não se imagine, leia-se. Porque este é daquelas BD que vale muito a pena ter.   

Sem comentários: