Dificilmente vou ver um filme mais belo este ano. Belo pela fotografia. Pelos enquadramentos cuidados e planeados ao milímetro. O fotógrafo que existe dentro de mim não consegue escapar ao preto e branco, aos cinzentos maravilhosamente bem individualizados. Não consegue discernir entre a qualidade deste Ida enquanto filme e este Ida enquanto objecto plástico, obra de arte de fotografia em movimento. Mesmo para os que pouco ligam a essas coisas da fotografia, será impossível escapar à omnipresença do olhar do realizador, o que, bem vistas as coisas, acaba por ser estranho, já que um filme, apesar de ser uma arte colaboracionista, é sempre a província do realizador. É dele a "opinião" final. É dele o "produto" final. Portanto, reforçar que se nota, em muito, a mão do realizador, acaba por ser um pleonasmo.
Noutro dia li algo sobre Richard Linklater. Um dos atores afirmava, de forma orgulhosa e em respeito a Boyhood, que esse realizador pouco se importava se a luz incidia sobre a face do ator de uma forma ou de outra, tornando o plano mais ou menos belo. Pawel Pawlikowski é o exacto oposto desta opinião, tendo em conta este Ida, um filme tão arrebatadamente belo que chega a tomar conta da forma como o apreciamos e o vemos. Não tanto no conteúdo mas mais na forma cuidada com que é filmado, este Ida fez-me lembrar um outro filme, A Single Man de Tom Ford, pelo extraordinário apuro estético do mise em scéne. Contudo, e um pouco à semelhança desse, o filme como um todo acaba por sair a perder. Pawel Pawlikowski não é um realizador novato (vejam o Summer of Love de 2004) e o modo como estrutura os planos não é, de todo, alguém recente na arte de fazer cinema. Nota-se um profundo conhecimento alicerçado na história desta arte (será que vejo A Palavra de Dreyer neste filme?). Existe, por exemplo, um plano em jeito de leit motif (desculpem estar a usar tanto destes termos): os atores estão, em muito do filme, encostados a um dos cantos do enquadramento ou puxados muito para baixo, deixando uma grande quantidade de espaço em "vazio". Ou seja, Pawlikowski não fez as coisas ao acaso. Ainda assim, se calhar por via do tema (fala-se muito de deus, ou a protagonista não fosse uma freira prestes a fazer os votos), não me relacionei muito com o drama da história. Ou o formalismo quase claustrofóbico do filme acaba por me fazer sentir distante do tema, como se estivesse a ler uma tese.
Por favor, não me interpretam mal. Eu adorei o filme e acho-o uma extraordinária peça de arte, um dos mais belos filmes que alguma vez vi, reforço-o. Mas faltou-me qualquer coisa para me relacionar profundamente com o tema. Provavelmente será apenas o tema em si, que pouco me diz ou interessa do ponto de vista emotivo. Ainda assim, não deixa de ser interessante que, no mesmo dia em vejo um filme tão maravilhoso sobre fé, religião e deus, nesse mesmo dia é revelada a primeira imagem do primeiro filme onde irá aparecer em carne e osso Diana de Themyscira, a Mulher-Maravilha, um dos meus personagens favoritos de BD - do filme Batman v. Superman. Para quem acredita nestas coisas, é uma rica coincidência.
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