Como é que se conta a história de algo que não nos é familiar? É verdade que a maior parte dos filmes de fantasia que se multiplicam pela época do blockbusters não são exactamente relatos do dia-a-dia. Mesmo assim, conseguimos nos identificar a algum tipo de nível. Ou, pura e simplesmente, estamos ali para nos divertirmos. Um filme como O Muro de Doug Liman faz parte daquela intangível e inclassificável categoria (que os americanos tão bem controlam) de filmes que entretêm e, ao mesmo tempo, procuram temáticas mais profundas (na falta de uma melhor palavra e esta eu odeio). Uma narrativa de suspense, um thriller, que envolve apenas três personagens, o titular muro e o cenário de guerra no Iraque em 2007. De narrativa contida, parco em acontecimentos, é, contudo, um testemunho sobre o actual conflito entre a cultura ocidental e a muçulmana.
Dois soldados dos EUA são chamados para averiguar um conjunto de estranhas mortes no local de construção de um oleoduto, situado na planície deserta do Iraque, já a guerra tinha sido dada como terminada. Após várias horas de tocaia, decidem que quem quer que seja que tivesse alvejado as vitimas já estaria longe. Claro que não estava. Um dos soldados é alvejado e outro refugia-se por detrás de um muro. O franco-atirador, que mais tarde descobrimos ser iraquiano, enceta uma conversa via intercomunicador com a sua vitima ainda viva. O mise-en-scéne é a desculpa que o realizador tem para falar da emboscada e da divisão que existe entre duas culturas e dois pontos-de-vista divergentes. É óbvio mas, ao mesmo tempo, arquitectado de forma clara e eloquente.
Doug Liman, o mesmo de Edge of Tomorrow, deve gostar de narrativas cíclicas, de eventos que se repetem e os protagonistas procuram, nessa repetição, uma busca pela perfeição ou redenção. Enquanto que no filme protagonizado por Tom Cruise (talvez o último grande com este actor) a visão era futurista, em O Muro estamos no exacto oposto. Um mundo muito real e próximo mas com uma premissa, em termos formais, interessantemente similar: a criação de um ciclo. Este vício tem um objectivo e mais não quero revelar.
Aaron Taylor-Johnson carrega, em termos de interpretação, o filme praticamente sozinho e continua a cimentar a sua posição como um dos mais interessantes actores desta geração, depois de Animais Nocturnos de Tom Ford, em que já era o melhor deste filme.
Um filme forte e um melhor blockbuster (não o sendo) que muitos dos que por aí multiplicam-se nas salas de cinema. A ver!
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