Levantem as mãos aos céus. A temporada das séries de TV finalmente começou.




Estava com medo que a Era de Ouro podia estar a acabar. Desde o início do século XXI que uma das narrativas mais estimulantes da modernidade, a da série de TV, tem oferecido pérolas atrás de obras-primas. Os que lêem este blog mais atentamente já devem ter percebido as minhas favoritas: The Wire; The Sopranos; Breaking Bad; Guerra dos Tronos - listadas por assumida ordem de preferência (apenas uma nota para sublinhar que, antes destas, também houve Seinfeld e Twin Peaks).

O ano de 2017 andava pobre. Séries mais leves como as do Universo DC Comics da CW (Arrow, Legends of Tomorrow, Supergirl, Flash) andam pouco estimulantes, mesmo repetitivas, ao ponto de, excepto pela última, já as ter largado. Existiram outras mais interessantes como The Night Manager ou o prazer pop que é a portuguesa Sim, Chef, mas não enchiam-me as medidas. Faltava um enlevo. O não aguentar mais não ver o próximo episódio.

Eis que, num espaço de poucas semanas, o panorama muda por completo. Começa a terceira temporada de Fargo, a segunda de Sense8 e a novidade American Gods - também foi lançada a sexta temporada de Veep, mas já falei tanto desta que parece-me desnecessário chover no molhado.


Começo pela última, a única com apenas dois episódios lançados para um total de oito desta temporada: American Gods. Baseada no livro homónimo de um dos meus autores favoritos, Neil Gaiman (o mesmo do essencial  Sandman), à altura tinha entusiasmado com as mesmas temáticas (e manias) da lendária obra de BD, de deuses e humanos a co-habitarem um mundo onde os segundos pouco uso já fazem dos primeiros. Era a história de Shadow e Wednesday, dois companheiros de viagem pouco amistosos um para com o outro (não faço nenhum spoiler para não estragar quem não leu o livro, mas aconselho-o). A série é produzida e escrita por um conhecido "monstro" da TV, Bryan Fuller, o mesmo da tenebrosa Hannibal. A conjugação deste dois homens de singular visão artística promete (depois de ver apenas o primeiro episódio) algo muito especial e único. Adulta, sangrenta, quente e cheia de deuses esquecidos pela fé.


Sense8 estreou todos os 10 episódios na Netflix no passado dia 5 de Maio e é, oficialmente, o vício do mês. A história dos sensates, um grupo de oito pessoas espalhadas pelo mundo que partilham de uma poderosa e complexa ligação extra-sensorial e emocional é das minhas maiores drogas narrativas dos últimos tempos. A complexidade e profundidade dos muitos personagens, a robustez das relações e uma realização de ritmo viciante torna-a, no que a mim diz respeito, impossível de largar. As Irmãs Wachowski e J. Michael Straczynski conseguiram criar um universo palpável mas, acima de tudo, com personagens construídos no limite do real, capazes de emocionar velhos empedernidos.


Em último mas, decididamente, não a menos importante, Fargo. No terceiro parágrafo citei as minhas séries de TV favoritas de sempre. Faltou esta que, tendo em consideração as duas temporadas e um terço que já saíram, está lá em cima com o nirvana que são The Wire e The Sopranos. Noah Hawley, o escritor, consegue extrapolar da atmosfera construída pelos Irmãos Coen no filme em que é baseada a série e edificar algo digno da mais alta literatura. Tem conseguido captar actores conhecidos da 7.ª Arte como Martin Freeman, Kirsten Dunst e, nesta, Ewan McGregor (a fazer o papel de dois irmãos gémeos) mas esta obra é muito mais que isso. É uma cinematografia impecável que ombreia com os melhores filmes. É um argumento complexo e cheio do humor gelado do estado do Minnesota, onde a acção ocorre. É, acima de tudo, a prova de que as séries de TV não são, decididamente, o que eram no tempo dos nossos pais e e avós.

Sem comentários: