Secret Wars (2015), números sete, oito e nove

(leiam aqui posts anteriores sobre esta série)


(contém spoilers para os números anteriores da série)

As últimas páginas do primeiro número de Secret Wars oferecem uma derradeira e devastadora cena: a destruição completa dos universos principal e Ultimate da Marvel. No lugar destes aparece um novo mundo, uma manta de retalhos constituída por eras e universos díspares, roubados do defunto multiverso. A esse mundo deu-se o nome de Battleworld. O seu Deus é Victor Von Doom, salvador do multiverso, Regente Supremo e ex-maior vilão dos universos desaparecidos, o Dr. Destino.

Todos os leitores de BD de super-heróis sabem-no: estas histórias nunca irão acabar. Existirá sempre uma última página que revelará uma ameaça maior, um mistério por resolver. O enredo continuará e continuará até à última folha de um livro que ainda não foi escrito e que provavelmente nunca o será. É a natureza da coisa. Os leitores de longa data já o sabem. Faz parte do contrato. E ainda bem que assim o é. Nunca esperei que este Secret Wars de Jonathan Hickman e Esad Ribic fosse ser diferente.  Em muitas e muitas formas não o é. A História do Universo da Marvel vai continuar. Contudo, existem pequenas coisas em que acaba por sê-lo. Diferente, quero eu dizer.

Um dia destes, como em muitas outras obras de BD que esticam-se pelos meses e pelos anos, terei de reler este Secret Wars. Para saber se sobrevive à minha busca de unidade. Apesar de ser pelos mesmos autores, a necessidade de capítulos mensais poderá obrigar a um certo compasso dissonante, o que acontece muitas vezes na busca de "prender" os leitores todos os meses. Será por isso que achei os capítulos sete e oito um pouco menos encorpados que anteriores, onde Hickman e Ribic perdiam-se em criatividade na cosmogonia do Universo da Marvel. Pareceram-me um pouco mais orientados para a acção e menos para as deambulações quase esotéricas do escritor. Eu sei que isso é obrigatório na literatura de super-heróis, mas estava já tão habituado à qualidade dos capítulos anteriores e fiquei mimado. Provavelmente, a decisão de criar um capítulo adicional à saga tenha sido prematura. O tempo o dirá.

O que interessa, contudo, é como as coisas acabam. Só assim poderemos saber então se valeu a pena. O nono e último capítulo acaba por ser uma curiosa surpresa. Um conto desta escala, com o destino do Real em jogo, corre sempre o risco de tornar-se obeso e operático, no pior sentido que estas palavras podem ter. Traduzindo por miúdos: afastar-se do humano. Hickman e Ribic escolhem um outro caminho. Escolhem enquadrar o conflito na mais velha rivalidade do universo Marvel: Reed Richards / Sr. Fantástico vs Victor Von Doom / Dr. Destino. Eles foram os primeiros e mais fortes antagonistas deste mundo ficcional. Uma luta de dicotomias. Um confronto ideológico e primal. É, portanto, apropriado que as últimas páginas deste Secret Wars, que pretende ser a elegia do antigo universo Marvel, contenham o derradeiro confronto entre estes dois adversários. E é também apropriado o destino (perdoem o trocadilho) escolhido para o vilão e para os heróis, o Quarteto Fantástico, equipa da qual Richards é líder e mentor. Neste sentido, Secret Wars parece funcionar bem como o fechar da cortina do universo Marvel, para aqueles que foram os primeiros a pisar o seu palco. 

A revista do Quarteto Fantástico foi a primeira e mais inovadora desta editora. Aquela que, sob o génio de Stan Lee e Jack Kirby, criou uma inteira mitologia e cosmogonia. Exibia mesmo o epíteto de "melhor BD do mundo". Ultimamente vivia apenas da glória destes tempos idos. Secret Wars, além dos propósitos mais comercias, acaba por ser um adeus a este primeiro grupo de super-heróis. Teve falhas mas foi, para mim, uma das mais bem conseguidas sagas deste estilo feita nos últimos tempos. 

Agora, a história vai continuar e continuar e continuar...

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