Secret Wars (2015), a primeira e segunda semana.


Em posts anteriores falei do primeiro e segundo números do evento da Marvel em 2015, aquele que promete mudar o universo desta editora: Secret Wars, cortesia dos talentos Jonathan Hickman e Esad Ribic. Todos os anos as duas maiores produtoras de mitologias de super-heróis do mundo publicitam que o evento desse ano será aquele que, para sempre e de forma irrevogável, irá modificar a geografia cosmogónica dos seus universos. Na maior parte das vezes, essas mudanças ou não são tão radicais quanto anunciado ou as modificações são eliminadas pouco tempo depois. Contudo, e até prova em contrário, parece que este ano as coisas serão efectivamente diferentes. Muito à semelhança da única história que verdadeiramente mudou o panorama do seu universo de super-heróis, Crise nas Terras Infinitas, e no ano em que faz 30 anos, quer a DC, quer a Marvel, parecem empenhadas em homenagear este clássico de Marv Wolfman e de George Pérez. A DC escolheu fazê-lo com Convergence (do qual tenho falado extensivamente aqui). Para a Marvel parece ser Secret Wars.

(para quem não leu os dois primeiros números da minissérie principal, a partir daqui existem alguns spoilers)

As últimas páginas do primeiro número de Secret Wars, e tal como prometido pelos autores, oferece uma derradeira e devastadora cena: a destruição completa dos universos principal e Ultimate da Marvel. No lugar destes aparece um novo mundo, uma manta de retalhos constituída por eras e universos díspares, roubados do defunto multiverso. A esse mundo deu-se o nome de Battleworld. A coleção de reinos que constituem Battleworld serão o foco, ao longo dos próximos meses, de múltiplas minisséries. Cada uma delas conta uma história singular que, contudo, não deixa de fazer parte do mosaico que é a nova realidade do universo da Marvel (vejam a imagem abaixo para mais detalhes da geografia). Nas duas primeiras semanas foram já lançadas um total de 15 novas séries. A primeira impressão que posso vos oferecer é que, de uma forma geral, a qualidade é claramente superior aquela que a DC nos ofereceu em Convergence. A razão reside, acima de tudo, no talento e na liberdade que o mesmo teve para contar o seu lado desta macro-história. Uma macro-história iniciada há uns anos atrás pela mente insana de Jonathan Hickman nos Vingadores. Tudo planeado de forma exaustiva, o escritor sabia que a estrada terminava em Secret Wars. A editora e os criadores de diferentes títulos sabiam que o fim do universo Marvel estava à porta e prepararam-se para isso.

Não gosto de falar dos títulos que apreciei menos, portanto não vou dedicar muito tempo aos mesmos. Contudo, quero fazer um reparo antes de avançar. Ainda não tive oportunidade de ler Ultimate End porque estou à espera de conseguir ler os números de Miles Morales que precedem esta série. Dito isso, destaco desde já o maravilhoso primeiro número de Old Man Logan que, sem surpresas, destaca-se de forma soberba. Bendis na escrita e, principalmente, Sorrentino nos desenhos são excepcionais. A artista já tinha dado prova no Green Arrow de Jeff Lemire e aqui continua sem interrupções a entregar alguma da melhor arte na BD americana actual. Fiquei particularmente impressionado com Inferno de Dennis Hopeless e Javier Garrón, não só pela qualidade do trabalho de ambos mas também por um pequeno toque de nostalgia. Para quem anda nestas andanças da BD dos X-Men há alguns anos, é interessante regressar a este evento do passado. Tal como acontece em muitas das séries de Secret Wars, parte-se do pressuposto que o final de uma determinada história do passado da Marvel não foi o contado - uma espécie de "O que aconteceria se?...". Neste caso, os vilões venceram e os mutantes mais famosos do mundo têm que arcar com as consequências de um mundo ameaçado por demônios. Outras séries das próximas semanas seguirão o mesmo caminho mas com outros momentos da História dos X-Men e não só. Infinity Gauntlet, neste sentido, acaba por ser uma agradável surpresa. De facto, a história anda à volta das Gemas do Infinito e de Thanos, mas num mundo onde ele não é o seu supremo governante nem tampouco estamos inteiramente a par do que realmente ocorreu neste reino de Battleworld. De destacar os maravilhosos desenhos de Dustin Weaver. Outra agradável surpresa é Inhumans: Attilan Rising que, ao contrário de outras séries, escolhe o caminho da relevância (ou pelo menos assim parece) no macro-contexto de Secret Wars. Tudo é arquitectado de forma simples e sóbria, sem esquecer o puro valor de entretenimento que o evento deve ter. Também é agradável ver Garth Ennis, o famoso escritor de Preacher, a regressar à Marvel com Where Monsters Dwell, que parece oferecer um cenário ideal para o escritor: aviões da Primeira Guerra Mundial e dinossauros. Ainda que este primeiro número não tenha sido excepcional já que Ennis parece continuar a escrever os mesmos (detestáveis) personagens, não deixa de ser prosa deste escocês, que é melhor que muita outra prosa. Finalmente, destaco os esforços interessantes de Master of Kung Fu (com um dos meus mais saudosos personagens - quem não adora esta série da década de 70?), Planet Hulk e Battleword, que culminam as séries (bem visto, quase todas) de que mais gostei nestas duas primeiras semanas.

Secret Wars, apesar de aludir à primeira série-evento da Marvel, a homónima da década de 80, é também uma carta de amor de Hickman a Crise nas Terras Infinitas. Estamos defronte da filha destas duas emblemáticas histórias. Esperemos que continue no excelente caminho destas duas primeiras semanas.

(NOTA - Gostaria de ter falado do facto de Battleworld se assemelhar a Westeros das Crónicas de Gelo e Fogo de George R.R. Martin, mas isso fica para a próxima vez. O post já vai longo demais)




Sem comentários: