Blue Jasmine de Woody Allen

Cate Blanchett é fenomenal neste filme. Pronto, já o disse, como tantos outros antes de mim e mais uns depois. A sua capacidade de levar ao extremo dos sentimentos e do desespero este personagem é, efetivamente, reservada apenas àqueles que carregam dentro de si o talento e o caos suficientes para conseguir uma proeza deste gabarito (já o dizia Nietzsche). Se Cate não vence nenhum prémio com o papel desta mulher, mutuamente destroçada e enamorada, então roubem-no à Gwyneth Paltrow, que até hoje não percebo como ganhou alguma coisa com o Shakespeare in Love (e até simpatizo com a rapariga, mas convenhamos…). Há uma sinfonia multi-instrumental a ser tocada na face e nos gestos de Blanchett, que consegue colocar a nu um personagem criado por outro génio, o realizador/escritor/autor Woody Allen.

E está aqui outra surpresa deste Blue Jasmine, ou seja, Allen afinal continua vivo, não que alguma vez achasse que estivesse menos dotado mas, talvez, mais complacente com o percurso e se resignasse a “divertir-se”. Nada mais longe da verdade, como este filme tão bem atesta. O realizador nova-iorquino, que espero ver um dia a filmar Lisboa, volta a exibir a justificação porque, com a idade, as coisas tornam-se mais claras, ou melhor, definidas pela indefinição.


As aparências iludem, não somos exatamente aquilo que parecemos nem tampouco aquilo que os outros pensam que nós somos. E este Blue Jasmine é, também, um filme sobre o que aparentamos ser e aquilo que, forçados pelo cair dos dominós, temos mesmo de ser. Muitos são os personagens que são uma coisa no início deste filme e que, no seu decorrer, revelam-se ser outra. As áreas de cinzento com que, pelo senso-comum, costumamos classificar o real, estão devidamente representadas. Personagens fortes são, na realidade, fracos. Personagens elitistas são, na realidade, naif. Personagens humildes são, na realidade, sujeitos aos mesmos sonhos vácuos de todos os outros. Nesta sinfonia (outra vez) existe a batuta exímia de um maestro que, de tanto tocar, acaba por, num determinado dia, acertar nas notas e forçar o divino para fora do interior do corriqueiro.
 
Voltaste, Woody, e estás completamente a-perdoado.

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