Este segundo volume do Le Club des Divorcés de Kazuo Kamimura fecha a história iniciada no primeiro tomo (leia aqui), recital da vida de uma jovem mulher de 25 anos, Yuko, divorciada, dona de um bar de alterne no bairro de Ginza, Tóquio, durante a década de 70. Esta obra, publicada em França pela editora Kana, permanece inédita em Portugal. É o espelho de uma época e de uma civilização pelos olhos de uma mulher numa sociedade fortemente machista como o é a japonesa.
Para tentar perceber o impacto de um livro chamado O Clube das Divorciadas teremos de ter noção de algumas questões relativas à cultura japonesa e ao peso da palavra "divorciada" na sua sociedade. Até o século XIX, o divórcio não era aceite no Japão, com consequências muito mais negativas para a mulher. Veja-se, por exemplo, o filme Os Amantes Crucificados de Kenji Mizoguchi (em exibição num ciclo deste realizador no Nimas), onde, (spoiler do filme) tanto homem como mulher praticam o adultério, mas enquanto ele é apenas destituído dos seus bens (não pelo facto de ter amante) ela é crucificada junto com o seu amante. Depois de 300 anos do período Edo, onde o Japão esteve sob o jugo de um shogunato ditatorial, serão necessárias gerações e vincadas cisões civilizacionais para vencer tiques societais.
Kazuo Kamimura relata-nos a história desta jovem mulher em pequenos episódios, enquanto tenta adaptar-se a esta vida, vencer o lado social e emocional do divórcio e contornar os muitos amores que desperta. Cada um dos contos é narrado com a leveza de uma bafo de cigarro na noite fria de Inverno, os sentimentos e os gestos mais subentendidos que declarados, espelhando não só a sensibilidade do autor mas, acima de tudo, a sua herança cultural.
Kamimura (que também aparece na história a frequentar o clube da protagonista) enceta um manifesto feminista engajado, escrito e desenhado com a subtileza dos jardins invernais nipónicos e que permanece relevante mesmo que volvidos 40 anos desde que foi feito. Leitura essencial!
Sem comentários:
Enviar um comentário