No mundo dos super-heróis das duas maiores editoras do género, este foi um ano de Renascimentos e Guerras Civis. São já banais os eventos "world-shattering" e "reality-unraveling", ao ponto dos fãs (pelos menos os mais velhos... como eu) os receberem com uma elevada dose de cepticismo. Bem vistas as coisas, quando uma saga tão sísmica como Crise nas Terras Infinitas de 1986 (spoiler) pode ser desfeita em Convergence então tudo é possível. Ou seja, por maiores que sejam as mudanças sabemos que, mais tarde ou mais cedo, tudo volta ao seu estado anterior - poderá é demorar décadas. É a natureza dos super-heróis da DC e da Marvel: quanto mais mudam, mais permanecem iguais. Dito isto, este ano teve os seus altos e baixos, como é natural, e na rubrica O Vício do Mês fui dando-vos conta das minhas leituras da Eterna Novela - não sei se alguma vez chagaram a esta conclusão, mas as telenovelas brasileiras são coisa de meninos comparadas com as dos super-heróis que permanecem, algumas, há sete décadas. Depois de tantas e tantas páginas existe sempre a vontade de fazer um balanço do que mais gostei de ler. Sendo assim, bem vindos às leituras com que mais delirei em 2016 no mundo dos super-heróis da DC e da Marvel. Hoje é a vez dos divinais.
Tão bons que deveriam durar para sempre.
Batman (DC New 52) - O Cavaleiro das Trevas, como também é conhecido, empresta-se às mais variadas interpretações. Mesmo aqueles que apenas o conhecem do Cinema sabem disso. Tim Burton, Christopher Nolan e Zack Snyder deram-nos três Batman diferentes. É da BD e da longa história do personagem que isso nasceu. Este ano de 2016 viu o fim de uma visão e o inicio de outra. A nova, a de DC Rebirth, a do escritor Tom King, é boa mas não tanto quanto a outra, a de New 52, a de Scott Snyder e Scott Cappulo, uma das mais emblemáticas runs até hoje feitas. Fechou com a derradeira batalha contra Joker, com um novo Batman, com o regresso de Bruce Wayne à sua capa e máscara e com três capítulos de encerramento (do 50 ao 52) tão bons quanto qualquer mega-saga. Lá em cima com os grandes criadores do personagem.
Detective Comics (DC Rebirth) - Ainda estamos do lado de Batman mas na revista que o viu nascer em 1939. Depois do livro/evento que foi DC Rebirth, este título regressou à sua numeração original, recomeçando do 934. Tudo para preparar-mo-nos para 2018, para o número 1000 desta e de Action Comics, para os 80 anos da DC, para a conclusão de DC Rebirth. Contudo, a editora não ficou-se pelo gimmick e entregou as rédeas da criação a James Tynion IV, Eddy Barrows, et al, e tem produzido a mais entretida publicação de Batman pós-DC Rebirth. Ao invés de focar-se apenas em Bruce Wayne e no seu alter ego escolhe antes desviar a atenção para a sua legião de aliados: Batwoman; Spoiler; Orphan; Red Robin; Clayface. Pelas mãos do escritor tem sido possível lermos um título francamente excepcional, cheio de surpresas e personagens genuínos e verdadeiros.
Doom Patrol (DC Rebirth) - A minha editora favorita de super-heróis tem conseguido recuperar a esperança na sua qualidade. Para isso também contribui a nova imprint Young Animal e este título, o melhor dos quatro, escrito por Gerard Way, com desenhos de Nick Derington. Regressa a Doom Patrol mas não só. Regressa a sua iteração mais esotérica, o seu lado mais surrealista, o inaugurado por Grant Morrison na década de 80 e 90. Way e Derington fazem isso mas com novos personagens, com os antigos personagens, com irreverência, com desenhos fabulosos, com uma energia transbordante de loucura. A história tem o carimbo da excentricidade do surreal mas não perde foco nem consistência. Talvez seja um Grant Morrison com um pouco menos de LSD ou, então, eu já estou habituado a isto.
Justice League (DC New 52) - Geoff Johns, Jason Fabok e Francis Manapul deram-me um título que parecia feito no paraíso da minha imaginação. Claro que era da DC mas era também a maior equipa de super-heróis existente numa história em que defrontavam os dois maiores vilões da sua tapeçaria, Darkseid e Anti-Monitor, narrado do ponto de vista do meu personagem favorito de BD, a Mulher-Maravilha, e com o tecido da realidade espaço-temporal em risco. Chamaram a isto Darkseid War e acabaram com um revelação surpreendente sobre o meu tal personagem favorito e com uma ponte para DC Rebirth. Dificilmente poderia ser melhor e, neste ano de super-heróis, não foi.
Ultimates (Marvel) - o título solitário da Marvel nesta lista dos meus divinais. Durante meses figurou na minha lista do favoritos do Vício. Os últimos capítulos poderiam ter sido melhores mas o trabalho de Ewing e Rochafort foi forte o suficiente para aguentar o golpe. Uma vez mais, estávamos perante uma história macro-cósmica, daquelas que apenas podem existir na mitologia dos super-heróis: heróis hiper-poderosos; vilões que fazem tremer o Diabo em pessoa; a Realidade literalmente agrilhoada por uma ameaça ainda desconhecida. Faz lembrar o trabalho de Grant Morrion na JLA mas também o de Jim Starlin em Warlock. Foi e continua a ser um dos meu títulos de eleição todos os meses.
Wonder Woman (DC Rebirth) - e chegamos ao fim e não podíamos acabar de melhor forma, com a eterna Diana. Greg Rucka na escrita e Liam Sharp e Nicola Scott nos desenhos, têm recuperado a Princesa de Themyscira no evento DC Rebirth. Com o primeiro desenhista, Rucka descobre as mentiras por detrás da origem de Diana. Com a segunda, explora os seus primeiros anos no mundo patriarcal, numa clara alusão, inspiração e reverência ao melhor de todos no que toca à Mulher-Maravilha: o escritor/desenhista George Pérez. Se Sharp é medieval e mitológico, dando-nos uma Diana visceral e guerreira, Scott prefere a angelical e inocente, uma jovem acabada de sair da virgem ilha de Themyscira. Estes dois lados são apenas duas faces do crescimento do personagem, funcionando como testamento à sua maturação no mundo dos homens, contrapondo o paraíso de Themyscira com a realidade do nosso lado. Rucka tem conseguido exceder o seu primeiro trabalho com a Mulher-Maravilha e consolidar-se do lado dos melhores.
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