Tangerine de Sean Baker

(novamente a rubrica Quando estreia?, sem mérito nenhum e muita sorte, consegue prever um filme que iria estrear. Esta semana temos esta experiência filmada em iPhone chamada Tangerine. Segue o que se escreveu num post anterior)

Tangerine de Sean Baker vem com várias recomendações.  Fez parte de várias listas dos melhores filmes de 2015. Fez furor no Festival de Sundance nos EUA. Foi integralmente filmado com um iPhone. A curiosidade era mais que justificada.

O enredo passa-se num dia da cidade de Los Angeles onde acompanhamos duas amigas enquanto uma delas tenta encontrar o seu namorado/chulo que, alegadamente, a terá traído com outra das suas prostitutas. Apesar do móbil da acção ser a jovem traída, ambas são protagonistas num drama que, ainda que ocorra num universo hermético, possui uma universalidade que o exporta para o círculo do relacionável.

As duas protagonistas, Kitana Kiki Rodriguez e Mya Taylor, são dois furacões em movimento pela labiríntica e ensolarada Los Angeles, uma cidade ela própria longe das referências europeias de urbe. Oferecem um desempenho cativante que nos obriga a estar constantemente a prestar atenção ao ritmo acelerado do seu discurso regional e cheio de colorido. São ao mesmo tempo sofredoras e lutadoras sem medo, procurando sublinhar-se como pessoas. Não há quartel na sua luta, o que se espelha no tom das suas vozes, na ferocidade do seu andar e na velocidade que partem na afirmação dos seus desejos. Não há espaço para duvidas. Ou, pelo menos, assim o parece porque, na realidade, há e muitas. 

A realização de Sean Baker é de tal forma energética e estudada que nos faz esquecer o facto de ser integralmente filmada em iPhone 5S. A montagem é rápida, emprestando a velocidade das protagonistas ao passo do enredo.  Muito à semelhança de Victoria de Sebastian Schipper, o elemento técnico  vai muito para além da curiosidade e assume-se como elemento da narrativa, de forma plena e descomprometida.  Abre espaço para esperança da democratização do Cinema, algo que Martin Scorcese abordou numa conhecida carta endereçada à sua filha. Mas como também ele diz, não basta a facilidade com que podemos fazer filmes hoje em dia. Para ser Cinema é preciso mais que isso, uma magia que junta enredo, técnica e talento. E isso este Tangerine tem de sobra. 

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