Barbara de Christian Petzold

Existe, neste filme, um esforço para que a história, o entrelaçar dos diálogos, dos sentimentos e das ações, funcione. Funcione para lá da execução mecânica, da eficácia da queda organizada dos dominós. Da reação que vem depois da ação. Aqui tudo é sentimento, amor, palavras escritas em ações vindas do coração, ações que ultrapassam a razão e o razoável. Este é, pura e simplesmente, um belíssimo filme.
 
Barbara é médica na República Democrática Alemã em 1980, condenada a exercer a sua atividade numa aldeia, após uma tentativa frustrada de se evadir para o Ocidente. No hospital para que é destacada conhece um colega de profissão afectuoso que a tenta conquistar desde o primeiro momento. Ao mesmo tempo que tenta obstruir os sentimentos dele e dela, planeia a sua segunda tentativa de evasão com um amante. Todo o filme pendula entre estes dois temas, o amor e a liberdade, ambos entendidos nas suas formas mais puras e – porque não dizê-lo - sublimes.
 
O ponto de vista escolhido é sempre o da titular do filme que, contudo, é-nos revelado telegraficamente, a conta gotas, para que o realizador possa lentamente desconstruir o desejo de evasão, de fuga, de liberdade, sentimento esse com o qual facilmente nos identificamos e que associamos aos residentes do outro lado do Muro de Berlim. Este desejo, em consequência dos pequenos momentos que constroem o dia-a-dia destes dois personagens, quer sós, quer juntos, vai se transformado e evoluindo, e com ele a história. Existe um momento chave em que nos é contada uma história dentro desta história, sobre sucedâneos, e nesse pequeno e genial pedaço de tempo, tudo se muda e, sim, tudo se transforma.
 
Fala-se ainda de maternidade, do legado que deixamos aqueles que nos seguem, daquilo que ensinamos. Não pelas palavras mas pelos atos, pelos gestos de carinho, compaixão e amor que altruisticamente estendemos aos que nos são mais novos e livres de passado e futuro.

Existe, na paisagem despojada de bens materiais que era a ex-RDA, um enaltecimento do que pode ser considerado como verdadeiramente importante. Nunca de forma bruta, paternalista ou panfletária, antes calma e arejada.
 
Finalmente, não pode falar-se de Barbara sem mencionar o excelente trabalho dos dois atores principais, Nina Hoss e Ronald Zehrfeld, que ajudam a construir o difícil caminho de quem habitava a ex-RDA, imersa na desconfiança, no medo, no julgamento em prol de “um bem comum”. No último momento, o plano final, é nos dada toda a informação que interessa saber sobre o final da história, derramando sobre os espectadores e de forma avassaladora todos os sentimentos em jogo, toda a beleza construída. E tudo resumido num olhar.

Assim dá prazer ir ao cinema.

Sem comentários: