A
maior queixa legítima que os que querem entrar na BD americana de super-heróis
podem fazer é conhecida: “Se ler este livro tenho a história toda?”. Para os
apreciadores e, principalmente, para os que a seguem há muito (35 anos no meu
caso), parte do prazer reside exatamente na chamada continuidade, na
interminável telenovela interconectada de várias décadas e vários títulos. Mas,
para a maior parte das pessoas que não têm tempo, vida ou nenhum interesse,
isso não interessa para nada – passo a redundância mas tinha de citar esse
ícone da cultura popular, a Teresa Guilherme. E daí estes pequenos posts neste vosso Blog em
que vou tentar guiar-vos por uma leitura equilibrada e balizada de alguns dos
melhores personagens da BD americana. Começo pelo mais fácil porque sou um
cobarde e um preguiçoso: o Demolidor (Daredevil
no Original).
Para
começar a leitura de qualquer super-herói que se preze temos de entrar pela sua
origem e, raramente, uma foi tão bem re-imaginada como a do Demolidor pela
parceria entre o mais importante dos seus autores, Frank Miller, e um dos mais prestigiados desenhadores do panorama
americano, John Romita JR. A história
chama-se Daredevil, the man without fear
e foi originalmente publicada entre 1993 e 1994, relatando os primeiros anos da
vida de Matthew Murdock, o jovem
residente de um dos piores bairros de Nova Iorque, Hell’s Kitchen, a sua adolescência, o acidente que o cegou e lhe
deu poderes sobrenaturais, o primeiro
encontro com um dos seus maiores inimigos e, principalmente, a história do seu
primeiro amor, Elektra Natchios, a
boémia grega filha de um embaixador que deu nova cor à vida do protagonista.
A
história, que na década de 60 havia sido relatada de forma sintética, é
espraiada ao longo de mais de 100 páginas, com a claríssima assinatura de Frank Miller que, à data, já havia se afirmado
como um dos maiores auteurs do
panorama da BD americana em geral e do Demolidor em particular, tendo sido o
exclusivo responsável pelo renascimento do personagem no início da década de
80. Frank Miller desenha diálogos e
um ambiente saídos dos contos pulp e
filmes noir que tanto apreciava
enquanto criança, ao mesmo tempo que sublinha a vertente cristã que já havia
introduzido em contos anteriores de Matt
Murdock. A Nova Iorque de Miller
é a uma Big Apple pré-Giuliani, a cidade
de Taxi Driver de Martin Scorcese, suja de sangue humano
misturado com a fuligem dos carros e despejado nas ruas de concreto gretado. Os
homens são americanos do sonho republicano, com vidas marcadas pelo trabalho e
pela honra, o suor que escorre de costas lavradas pelos ventos agrestes do
tempo. E no meio disto tudo surge um homem cego que, ainda inocente, levanta os
punhos da justiça para fazer jus a um voto eterno. Como companheiro de copos de
bourbon em bares esconsos, Miller tem o impressionante contador de
histórias John Romita JR, que vai
para muito para além do mero trabalho por encomenda.
Acreditem
em mim que ao ler esta têm o caminho aberto para, caso vos interesse, continuar
a ler o Demolidor. Mas não desesperem que estarei aqui para vos guiar por mais
umas coleções que considero essenciais.
2 comentários:
Olá! :)
Só te faltou dizer que essa obra "Daredevil, the man without fear" está editada em português pela Devir!
"Demolidor, o homem sem medo"
;)
Obrigado, Nuno, de facto faltou-me. Mas já nem me lembrava tb. Obrigado pelo complemento.
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