Nunca pensaram se têm uma época favorita? Um momento no passado onde achavam estar mais em casa? Esqueçam que a esperança média de vida era bastante inferior à de hoje. Não liguem ao facto de podermos morrer por um simples corte num prego enferrujado. Quando lemos um livro ou vemos um filme passado numa época de que gostamos muitas vezes esquecemos que um dos mais curiosos padrões de beleza era o facto de termos os dentes todos e direitos. Woody Allen já tinha falado disto no filme Midnight in Paris. Os personagens desse filme (que são sempre, de alguma forma, ele próprio) viajavam para épocas que consideravam ser melhores que aquela onde viviam. Contudo, descobriam que, afinal, as coisas não são nada assim. Em qualquer altura na História existe desejo por uma outra do passado, sempre idealizada. Em Café Society fica a sensação que Woody Allen esquece-se da lição de Midnight in Paris e mergulha de cabeça no saudosismo de uma época, neste caso Hollywood da década de 30.
Este filme é Allen vintage, com todos os tiques que lhe podemos atribuir, até com um sempre bom Jesse Eisenberg a fazer de Woody. Eisenberg representa um jovem judeu de Nova Iorque que viaja para Hollywood com sonhos de vencer na industria cinematográfica com a ajuda do seu tio, agente famoso na Tinseltown. No meio disso apaixona-se por uma bela moça, Kristen Stewart, e o resto são peripécias, gangsters violentos e trapalhões, concertos jazz, one liners deliciosos, conversas cheias de duplo sentido e de palavras trocadas a 100 à hora. Em resumo, Woody a ser Woody e claro que não há nada de mau com isso. No que a mim diz respeito adoro e ver um filme do realizador de NY é, na maior parte dos casos, um prazer despreocupado e não desprovido de sentido. Pode parecer redundante o tema e a abordagem de Café Society à luz do que disse no primeiro parágrafo mas Woody Allen está numa época da sua vida (tem 80 anos) em que aparenta estar mais preocupado em ter prazer nas coisas e, no seu caso, ter prazer implica mergulhar naquilo que lhe dá gosto.
Este é um filme sobre, entre com certeza muitas outras coisas, escolhas. Não só aquelas que fazemos mas, acima de tudo, aquelas que nos são impostas. Nisso é uma interessante obra sobre a idade, sobre o que fica por fazer e o caminho que poderia ter sido seguido. É verdade que não perde-se nestas conjecturas, preferindo o puro prazer da diversão, mas, como em muitos dos filmes de Allen, existe uma pitada de agridoce nos seus personagens, um arrependimento que pede pela imortalidade e pela capacidade de podermos fazer todas as escolhas possíveis no cardápio. Fica ainda a sensação de algumas das escolhas serem feitas sem paixão, de que tivemos de nos contentar e, por causa disso, somos obrigados a, por vezes, trair aqueles de quem gostamos - mas não com amor ardente. Se isto não é Woody Allen eu não sei o que é.
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