MOTELx 2016 - Sadako vs Kayako e Personal Shopper



No que a mim diz respeito, tenho uma grande admiração por quem exibe um gosto ecléctico. Por essa ordem de ideias, um festival que segue, na sua programação, a mesma filosofia, elogio-o pelas mesmas razões. O MOTELx tem sido assim e este ano de 2016 é mais um que o prova. O dia de ontem foi o último e assisti a dois filmes de linguagens bastante dispares. Um assumidamente pop, Sadako vs Kayako de Koji Shiraishi, e outro de autor, Personal Shopper de Olivier Assayas.

A cultura popular tem destas coisas deliciosamente kitsh. Agarram em personagens, filmes e conceitos famosos e colocam-nos em confronto. Batman v Superman, Alien vs Predator, Godzilla vs King Kong.  São brincadeiras de criança transformadas em realidade, jogos com figuras em que alguém gasta muito dinheiro para os passar para filme, BD, prosa, etc. Eu adoro! É, por vezes, ridículo, mas tão maravilhosamente reconfortante. Sadako e Kayako são dois monstros femininos de filmes de terror japonês "recente", a primeira pertencente à saga Ring e a segunda a Ju-On, êxitos tão significativos que deram origem a versões dos EUA. Passados 18 anos desde o primeiro Ring e 14 de Ju-On, os franchises continuam a dar material para novas iterações, mas desta vez em formato team-up. De terror isto já nada tem mas de abandono pop transborda. É desligar o cérebro e deixar-nos levar por hora e meia de pura diversão para quem, é mais do que óbvio, gosta destas coisas. Ficam agora duas perguntas no ar: para quando a sequela do team-up? Para quando algo deste estilo mas em versão erudita como Madame Bovary vs Lady Chatterley ou Édipo vs Hamlet?

Do lado oposto surge Olivier Assayas, auteur francês, com o maravilhoso Personal Shopper. Kristen Stewart protagoniza uma jovem a viver em Paris que perdeu o seu irmão gémeo recentemente, é médium de natureza e personal shopper para uma conhecida actriz por necessidade. Assayas é um realizador soberbo e este novo filme, em que volta a trabalhar com a actriz dos EUA depois de As Nuvens de Sils Maria, continua a cimentar a sua qualidade. Um filme perfeitamente enquadrado na temática do MOTELx que explora uma vertente mais intima da relação, sim, com o sobernatural, mas numa perspectiva emotiva de procura de conforto face a uma perda irreparável. O realizador explora também, de forma interessante, a relação com a tecnologia. Mensagens, video-chamadas e smartphones estão omnipresentes, como contraponto com a necessidade de procura de intimidade e de respostas que a protagonista procura em meios que são o oposto da ciência. Existe uma deliciosa e arriscada sequência de troca de mensagens essencial para o enredo e que revela, em profundidade, o abismo em que se encontra a personagem de Kristen. Aliás, a actriz prova, sem sombra de dúvidas, a sua qualidade e afasta-se de qualquer tipo de rótulo que possa advir de ter participado na saga Twilight. Continua a provar que não existem maus actores, existem maus realizadores (estou a exagerar, claro). Este foi, sem sombras de dúvidas, um dos grandes filmes que vi neste festival, associando-se à companhia de outros meus favoritos: February; Tickled; Under the Shadow.

MOTELx... então até para o ano. Que cresçam muito e mais.

Sem comentários: