Ir ao cinema não deve ser uma escolha baseada na língua, atores ou realizadores mas antes no nosso gosto. Por outro lado, deve-se experimentar, arriscar em filmes que, à partida, estão longe daquilo que nós gostamos. Só assim poderemos olhar para o mundo com os olhos do outro lado do mundo. Só assim podemos ver diferentes pontos de vista. Este A Temporada do Rinoceronte trata-se de uma co-produção Turca e Iraquiana realizada por Bahman Ghobadi, de origem iraniana. Desconhecia o trabalho do realizador, apesar de já ter ouvido falar de um ou dois dos filmes do seu catálogo, e fui ver este por recomendação directa de um amigo (curiosamente, depois lembrei-me que outro já me tinha dado a conhecer o trailer).
A película vem com dois nomes sonantes a si agarrados, de propósito para atrair a muito merecida atenção do público em geral: Monica Belucci como actriz principal e Martin Scorcese com o selo de aprovação. Contudo, fora isso, vale por si mesmo. O enredo envolve um triângulo amoroso tendo como pano de fundo a revolução islâmica iraniana, ocorrida em fins da década de 70. Ele um poeta e ela filha de um general. Casados e objecto de inveja de um terceiro, o intruso, chofer de Monica Belucci, a mulher. O amor deste terceiro consome-o a ponto do desespero. Com o advento da revolução os papéis invertem-se e o intruso vê-se munido de poder suficiente para encarcerar o casal e, de forma vil e retorcida, tentar conquistar o amor da bela mulher. Passados 30 anos, o poeta é finalmente liberto, depois de ser dado como morto, e tenta rever a mulher que foi-lhe tirada de forma violenta.
O filme é uma mescla de realismo atroz - pintura dantesca de tortura e maldade - e de poesia soprada pelas palavras de homens e mulheres que declamam os versos do encarcerado. Isto enquanto mergulhamos no desperdício de vida e amor, da vil inveja, da abjecta cobiça. Do aproveitamento ilícito da ideologia para aproveitamento mesquinho - não será isso, ao fim e ao cabo, o cerne de tanta revolução ou, pelo menos, de alguns dos seus atores? O que sobra é sempre a bondade e o sacrifício pelos que amamos. O altruísmo.
Este belíssimo filme, no meio destes sentimentos, constrói ainda uma narrativa sólida e robusta, cheia de trejeitos trágicos mas sem que caiam no ridículo ou na hipérbole. Os actores são perfeitos. A fotografia extraordinária. Em suma, e pegando nas primeiras palavras deste post, vale a pena arriscar e ver filmes de todos os cantos do mundo, porque apenas quando vemos muito e muito é que temos a sorte de conseguir pérolas desta beleza. A ver!
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