First Reformed (No Coração da Escuridão) de Paul Schrader

O que é hoje os EUA? Essa questão ecoa por todos os minutos deste maravilhoso filme do realizador Paul Schrader, também conhecido por ser o escritor das obra-primas da 7.ª Arte que são Taxi Driver e Touro Enraivecido. O silêncio e calmaria que permeia esta obra, esteticamente brilhante, parece ser a capa que disfarça uma tempestade voraz. Uma tormenta que quer consumir o mundo. Uma narrativa contida que esconde conflitos, desejos e ambições que ameaçam a sobrevivência, principalmente a do Homem.

Ethan Hawke , num dos melhores papéis da sua vida, é um ex-militar que perdeu o filho para a guerra e que, depois de ver destruído o casamento na sequência desta tragédia, decide enveredar pela carreira religiosa, tornando-se pastor de uma pequena e pouco frequentada igreja, pouco mais que uma atracção turística. Ao ser procurado por um jovem casal local, a sua visão do mundo ir-se-á alterar drasticamente e arrastá-lo para um crise de fé, não tanto em relação ao seu Deus mas antes ao Homem. O homem desse casal é um activista ambiental que vive angustiado com o futuro da Terra. Ela, por sua vez, está grávida, tendo sido a perspectiva do nascimento de mais um ser para este mundo que despoletou a crise existencial do jovem marido. Confrontado com a inexorabilidade da crise ambiental que se avizinha, vira-se para Ethan Hawke na busca de algum conforto espiritual, que não só não encontra como agrava o  do pastor, já de si com dúvidas. No meio desta convulsão interna, a personagem de Hawke entra em conflito com o chefe da sua igreja e com o CEO dono de umas das mais poluentes empresas da região.

Na realização, Schrader escolhe uma abordagem minimalista e austera. O tamanho do ecrã reduz-se ao essencial e antigo da TV, o mise en scéne lembra a artificialidade teatral, a paleta de cores evoca céus nublados e carregados. Não existe redenção, antes a busca desesperada numa narrativa que levanta perguntas pertinentes (sem dar respostas, como todas as boas obras de arte devem fazer) acerca dos EUA e mesmo do futuro do nosso planeta. Um filme aterradoramente actual, que experimenta, arrisca e funciona como um brutal soco para despertar, para arregalar os olhos. Mistura política, economia, ecologia e religião de forma serena mas pungente. 

Uma das mais importantes questões levantadas por este maravilhoso filme ocorre num diálogo entre Ethan Hawke e o seu chefe de congregação. Este último, confrontado com a crise do seu subordinado, afirma que ele tem de aprender a viver no mundo real, a afirmação de todos os "realistas" quando confrontados com aquilo a que chamam de "lirismos". Mas o despertar ecologista de Hawke é tudo menos lírico, é o mais realista que pode ser. A Natureza não espera pelo acordar das consciências. Ela é inexorável e terrível na sua realidade. Neste grande verdade residem outras mais pequenas. Temos de estar atentos às nossas decisões diárias, caso contrário caminhamos certeiros para o abismo. 

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