Manchester by the Sea de Kenneth Lonergan

Existem sentimentos maiores que Arte? Acredito que sim. Todos. Há quem diga que por vezes a Vida imita a Arte. Eu prefiro o contrário. Caeiro dizia qualquer coisa como nada é mais belo que a paisagem, a floresta, o seixo do rio. As coisas são o que são na beleza da sua simples existência. A Arte, no esforço tremendo, na busca para tornar a nossa estada mais agradável, tenta sempre encontrar as melhores formas de espelhar o que a Vida e a sua mãe, a Natureza, fazem sem sequer tentar. Quando a Arte tenta e consegue de forma mais poética, mais filosófica ou, simplesmente, mais bonita, encontrar esse olhar sobre um tema, é quando os espectadores, os leitores, os ouvintes, conseguem melhor entender a vida que carregam nos dias. 

Existem sentimentos verdadeiramente pesados, aqueles que nem a erosão do tempo consegue transformar em planície, acamar em forma fóssil. Perder um filho é um grito que nunca se deixa de gritar. Mesmo quando na cara permanece um sorriso para os outros. Mesmo quando insistimos para eles e para nós que as coisas estão bem.  Não existe revolta maior que a Natureza se rebelar contra ela mesma e inverter a sua ordem. Não deve acontecer assim e, quando acontece, perguntamo-nos porque temos de ser aquela estatística rara que achamos ser infinitesimal. Porque é que temos de ser um em um milhão.

Manchester By The Sea é sobre uma família destroçada e mesmo esta palavra soa a falso porque é pequena. Porque não é connosco. Porque não é contigo que lês estas palavras (mas se calhar já pode ser contigo, não é?). É arte que esforça-se por transformar a factualidade em explicação. Nem sempre consegue mas, às vezes, aqui e acolá, os actores exalam o sofrimento. Principalmente porque não se esforçam - ninguém se esforça - por articular pensamento em palavras. Tudo falha mas, ao mesmo tempo, faz todo o sentido. As palavras juntam-se à lágrima que enche a boca. Tudo mistura-se no rosto contorcido de saudade. 

Manchester By The Sea não é uma obra-prima mas, com um tema como este, será que precisa ser? Talvez, mas quem sou eu para julgar perdas desta envergadura?

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