It Follows de David Robert Mitchell (Vai Seguir-te)

Hoje estreia aquele que, provavelmente, será o melhor filme de 2015 para mim. Sem qualquer exagero. Tive a sorte de o ver no ano passado no MoteLX e, desde então, tenho feito uma pequena cruzada aos ouvidos e leituras daqueles que têm uma réstia de paciência para as minhas opiniões. É um filme de terror mas, mais do que isso, é um testemunho, uma tese, em como fazer excelente Cinema. A realização, banda sonora, cinematografia, tudo o que conspira para elaborar uma peça de Arte cinematográfica está neste filme conjugado de forma perfeita – no que a mim diz respeito, repito.

A carreira de Vai Seguir-te (já agora, boa tradução) começa em Cannes e arrasta-se por vários festivais de Cinema, culminando na estreia nos EUA em apenas quatro salas mas, devido ao passa-palavra e à afluência no primeiro fim de semana, acaba por estrear em umas poucas milhares a mais. Não fez fortunas mas, tratando-se de um filme de autor cujo terror está no lado oposto do gore misturado com nudez feminina gratuita, tem feito uma carreira simpática. Leram bem: Filme de autor. É disso que se trata e David Robert Mitchell é, como se diz no palavreado artístico, um “talento a observar”. Vai Seguir-te é um rasgado elogio à tradição do cinema de Terror da década de 80 e principalmente aos trabalhos de Wes Craven e David Carpenter. Deste último vai inclusive beber inspiração para a brilhante Banda Sonora - e eu não sou dos que ligam a essas coisas da música no Cinema, passando-me, na maior parte dos casos, ao lado. Por outro lado, descobri recentemente que a minha suspeita em relação à fotografia do filme não estava longe da verdade. Wallace inspirou-se no trabalho do fotógrafo Gregory Crewdson para a cinematografia de Vai Seguir-te (eu sei que estou-me a gabar. Podem cruxificar-me nos comentários). Assim, se ainda tiverem paciência, leiam a seguir o que escrevi no ano passado depois de o ver no MoteLx.

Dificilmente poderia acabar o MoteLx deste ano com um filme melhor - ou, se calhar, até podia, tendo em consideração a safra de qualidade impar que tive a sorte de provar. It Follows é a segunda longa-metragem de David Robert Mitchell (a primeira chama-se The Myth of the American Sleepover) e posso estar a ser precipitado mas este é um realizador a observar muito atentamente. O filme não só é um herdeiro mais do que capaz de outros senhores do terror como Wes Craven e John Carpenter (as influências mais diretas nesta película), como demonstra incrível e inspirada arte num filme cuja qualidade vai muito para além dos limites do género - vamos ver se me faço entender: este filme é brilhante e não só por ser grande no terror mas também porque estamos defronte de cinema de topo.

Por onde começar? A história mistura várias das roupagens conhecidas do filme de terror, quer estado-unidense, quer (atrevo-me a dizer?) japonês, principalmente da estirpe de Ring e Ju-On. Não é totalmente original mas cheira a qualquer coisa de inovador. No post em que falava do filme Honeymoon falei de algumas das regras relacionadas com sexo e adolescentes em filmes de terror. It Follows toca neste lugar-comum e transforma-o de maneira soberba. Depois existe a absurdamente bela fotografia de Mike Gioulakis, que faz lembrar o trabalho de fotógrafos como Gregory Crewdson ou a delicadeza estética de Lynch em Twin Peaks. Continua pela espectacular e altamente recomendável banda-sonora, que contribui de forma determinante para a atmosfera do filme. É difícil encontrar defeitos num filme que extrapola os limites do género e entra decidido no cinema de "autor", que é tão tido em alta conta na escola europeia de fazer 7.ª Arte. A destreza técnica e artística de Mitchell é de tirar o fôlego. O uso da grande angular e de enormes espaços vazios no enquadramento, não sendo algo verdadeiramente inovador no cinema (Kubrick fê-lo em The Shining, outra referência do género) é, contudo, em It Follows, inspirado - talvez mesmo genial. Existe a sensação de que estamos presentes a um todo estético, ambiental e tematicamente coeso e coerente. Mas, ao mesmo tempo, não existe refreio e matemática, antes alma e coração, sentimentos à flor da pele.


Falar de qualquer coisa da história, como já repararam em vários posts anteriores, não é algo que goste particularmente. Na escolha de filmes neste festival li o resumo - claro - que, contudo, prontamente esqueci. Peço-vos que façam o mesmo para este e todos os outros filmes que, se gostarem das minhas recomendações, vos aconselho vivamente a ver. It Follows  é, em todos os sentidos que dou à palavra, uma obra-prima e um mais do que digno coda para aquele que é o meu festival de cinema favorito em Lisboa. Um filme que é um digno herdeiro da tradição do terror da década de 80 mas que evolui e segue em frente.

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