Kaze tachinu de Hayao Miyazaki (As Asas do Vento)

Existem poucos realizadores de animação que conseguem fazer a ponte entre adultos e crianças: Hayao Miyazaki é um deles. Os mais crescidos podiam não o saber mas começaram a ser doutrinados nas artes deste autor quando viram Conan, o Rapaz do Futuro na década de 80. Muitos anos mais tarde, um filme, A Princesa Mononoke, arrastou para as salas de cinema espectadores menos habituados à linguagem da animação (japonesa e não só) e incitou-os a verem um "filme de desenhos animados para adultos". Aliás, depois de muito tempo, e fora dos habituais (e, desculpem-me, ultra-repetitivos) filmes Disney, tinha finalmente estreado no circuito comercial um filme de desenhos animados verdadeiramente original, diferente e soberbo. Seguiram-se outros, como o magnífico A Viagem de Chihiro, e este Asas do Vento culmina uma longa história de amor com o mestre Miyazaki. Culmina porque este é o derradeiro filme do realizador. Decidiu reformar-se.

Ao contrário da maior parte das suas obras, Asas do Vento envereda pelo realismo, deixando de lado o fantástico (excepto numas sequências oníricas).  É a história verídica do engenheiro que concebeu e construiu os famosos aviões Zero da 2.ª Grande Guerra, que deram uma reputação tenebrosa aos nipónicos neste conflito. Contudo, tirando pormenores subtis (mas pungentes), Miyazaki, narrativamente falando, refugia-se na vida antes da 2.ª Guerra Mundial, no longo e paciente caminho que levaram o engenheiro à construção da sua "obra-prima". E nesse caminho conhece a mulher e desenvolve uma bela história de amor e de dedicação mútua.

Apesar de Asas do Vento não ser o meu filme favorito de Miyazaki, não deixa de ser uma obra magnífica (esse lugar está reservado para os dois filmes que aqui mencionei e O Meu Vizinho Totoro). A assinatura do realizador está nos momentos que outros escreveriam e desenhariam de forma completamente diferente. Um terramoto por Miyazaki torna-se em algo tenebroso no seu silêncio (sim, silêncio). Nessa pequena cena consegue captar a essência de um povo, da sua sobriedade, da eloquência da serenidade face a uma catástrofe. A inspiração por Miyazaki vem da calma resolução, da força que nasce da calmaria. O clímax é um suspiro e não um grito. Existe nestas opções uma poderosa filosofia e é por isso que este não poderia ser outra coisa que não um filme de Miyazaki.

O mundo vai deixar de ver e ouvir um mestre.

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