O meu MoteLX 2014 - Aux Yeux de Vivants, Open Windows e Rouge Sang

Aux Yeux de Vivants de Julien Maury e Alexandre Bustillo (Among the Living)

Aux Yeux des Vivant (Among the Living) constituiu, infelizmente, a primeira decepção do MoteLX deste ano. Não por ser particularmente mau mas porque, essencialmente, também não é particularmente bom. Os dois realizadores assumem as suas influências do terror sediado nos EUA - este filme conclui uma trilogia de homenagem a essa "escola" -, mas o enredo e a estrutura narrativa são as grandes falhas, isto num esforço que, apesar de tudo, aplica os valores de produção que caracteriza o profissionalismo norte-americano (ou, pelo menos, aquilo que vimos como profissionalismo). Portanto, o amadorismo não está tanto nos meios usados, nos actores, na mise en scéne (que também não é particularmente inspirada), mas mais num argumento que começa de forma relativamente interessante mas que descamba para uma forma de inverosimilhança e fraca construção da história.

A história é uma repetição do "monstro", do serial killer, do ser humano "estragado" (lembra Halloween - até o homenageia na primeira cena). Um grupo de três amigos vêem um homem com uma máscara de palhaço a arrastar uma mulher amordaçada e amarrada para o interior de um estúdio de cinema abandonado  - a alusão a máscaras, novamente Halloween, e o comentário a uma época já passada do cinema de terror serão referências a que os realizadores aludem. O serial killer vê os três adolescentes e enceta uma perseguição que irá levar a uma variedade de momentos típicos do filme de terror de uma época de ouro nos EUA. Aquilo que poderia até ser considerado uma homenagem (e tenta-o ser) acaba por cair por terra pelas razões já apontadas: um argumento apressado.

PS - Existe um momento de nudez feminina particularmente gratuito que, na minha opinião, era escusado. Mas, se calhar, são essas as referências.

Open Windows de Nacho Vigalongo

Este não é um filme de terror. 

Uma espécie de homenagem a Rear Window to mestre Hitchcock, constitui um dos mais interessantes OVNIs que até agora tive o prazer de ver no MoteLX. O filme passa-se integralmente no ecrã de um computador, enquanto a câmara do realizador viaja entre as janelas abertas no monitor do protagonista (as titulares Open Windows). Um filme que, à partida, poderia ser repetitivo e enfadonho, por causa de um argumento rocambolesco e profuso em twists, de uma realização e edição frenéticas, transforma-se num thriller de suspense bastante interessante (ainda que, por vezes, um pouco rocambolesco demais).

Sinteticamente, um fã obsessivo (Elijah Wood) de uma conhecida atriz de filmes de ação (Sasha Grey), vence um concurso para um jantar com o seu ídolo. Acontece que a mesma acaba por cancelar e alguém oferece, usando o conforto do monitor do computador, para que o desiludido fã possa observar todos os movimentos da estrela usando a tecnologia de filmagem e localização disponível no mundo moderno. As leituras são óbvias. Num mundo onde todo e qualquer movimento, acção e espirro de uma celebridade são escalpelizados e observados até ao limite da obsessão (o Fappening vem à memória), um argumento que baseia o corpo nesta temática intemporal (sim, porque isto não é de hoje), juntando-a aos meios inacreditáveis de invasão de privacidade, só poderia ser pelo menos interessante. E, neste caso, é-o e muito. 

O realizador é competente na gestão dos tempos essenciais para nos manter interessados e, ao mesmo tempo, não muito confusos, num argumento que, ainda assim, requer mais que um visionamento para o acompanhar integralmente.  Os atores são a alma e a corrente que agarra o filme à terra, pelo seu talento e pela capacidade de "vender" uma história difícil e, por vezes, inverosímil. 

Chaira-me que este tem o perfume de filme de culto. O tempo o dirá.

Rouge Sang de Martin Doepner (The Storm Within)

Existem histórias que se têm de esperar até à última página, até ao último minuto, até ao último quadradinho, para que as possamos apreciar verdadeiramente. 

Rouge Sang desenrola-se no dia da passagem do século XVIII para o XIX, numa casa de família, perdida na floresta gelada do norte canadiano francófono.  O marido deixa a mulher grávida e seus três filhos em casa enquanto se desloca à aldeia mais próxima para comprar mantimentos. Devido a uma tempestade de gelo particularmente forte, fica retido na dita aldeia e a mulher e filhos vêem-se obrigados a dar guarida a vários membros do exército inglês, vulgos Red Coats.   O que começa de forma plácida e bucólica regride para o drama de home invasion e terror psicológico.  Escusado será dizer que mais não digo e que há que esperar até ao minuto final para nos apercebermos do alcance do drama.

Primeiro que tudo, quer a realização, quer a fotografia são particularmente interessantes, mostrando um controlo do claro/escuro, da luz e dos enquadramentos refreado mas veemente. Os actores, principalmente a mulher, são excelentes, construindo personagens que se deslocam entre os cinzentos da moralidade e não tanto no objectivo preto e branco.  E, mais do que tudo, a história é bem construída, parcimoniosa nos pormenores, mas objectiva naquilo que quer contar. Este é um dos casos em que o título original, Rouge Sang, é um pouco suplantado por uma das traduções, The Storm Within, pelo menos pelo que me é dado entender pelo meu conhecimento da língua francesa. De facto, a verdadeira tempestade não é, de todo, a que está fora das paredes da pequena casa de madeira.  

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