Como cinema, este filme não procura ombrear
com obras de renome, antes contenta-se em ser uma forma de biopic, especificamente sobre um período da vida desta filósofa alemã
e judia (a própria que me desculpe a classificação… já explico porquê). O
período é o da redação de um livro, originalmente publicado em fascículos da
conhecida revista norte-americana The New
Yorker, onde a pensadora dava aso à iluminada avaliação da natureza de um
criminoso nazi durante o seu julgamento, levado a cabo em território israelita,
avaliação que acabaria por extrapolar de forma genial para o Homem. É, aliás,
na força das ideias e convicções desapaixonadas desta brilhante mulher, e na
interpretação levada a cabo pela atriz Barbara
Sukowa, que a força do filme reside.
Se conhecia o nome Hannah Arendt já me havia esquecido (tenho de a ler com urgência),
mas o termo que cunhou, “A Banalidade do
Mal”, é de tal forma forte que já tinha passeado na orla da minha audição
e, pela incrível simplicidade da sua terrível verdade, se impregnado no saber,
mesmo que inconsciente. Algures por aí está a genialidade de um pensador à
frente do seu tempo. Este conceito, pelo menos da forma que o vejo (de certeza
limitada), significa a solidificação de uma mudança de paradigma imprescindível
a uma sociedade laica. A noção de que o Mal não é um ser vermelho de cornos
que, maquiavelicamente, planeia perversidades, mas antes é a inoperância, a
obediência cega, representa não só um desprender de preceitos infantis da
maldade mas, acima de tudo, uma libertação para todos nós, e a transversalidade
dessa liberdade dá-nos asas para crescermos como sociedade. Esse legado é
verdadeiramente arrebatador.
Hannah
Arendt, pela descrição do filme, terá sido um ser
humano sui generis. Apesar de
nacionalidade e religiosidade que nascimento e herança lhe conferiam, ele não se
limitava nestas fronteiras. Como diz no filme, e parafraseio: eu não acredito
em povos, acredito no Homem. Essa nobreza e generosidade acabariam por lhe
trazer fortes dissabores em consequência das ideias claras que tinha da
humanidade e do mundo. Contudo, até o ponto em que a narrativa do filme
transmite, ela aplicava esta clareza a várias facetas da sua vida, afastando,
assim, o argumento hipocrisia. Ela reconhecia a falácia da nossa natureza, até
aquela inerente ao seu marido.
Um filme que vale pela personalidade
retratada.
Sem comentários:
Enviar um comentário