História e Personagens da BD - Parte 3

Mulher-Maravilha


Diana de Themyscira é perto de perfeita. Provavelmente esse é o seu maior defeito. Ao contrário de Batman, existiram muitos poucos autores que souberam o que fazer com ela. Numa arte populada quase exclusivamente por criadores masculinos não será isso revelador do “receio” que ela impregna no frágil ego masculino?


Criada em 1941 por William Moulton Marston (também ele o inventor do detector de mentiras), a Mulher-Maravilha (Wonder Woman na sua língua natal) viu a luz do dia no mês de Dezembro desse mesmo ano na revista All-Star Comics n.º 8 (curioso ter “nascido” no mesmo mês onde se festeja o nascimento de outro ser considerado perfeito).


A sua história teve já várias versões mas é a de 1986 que me ficou na memória, a re-inventada por George Pérez. Nesta, as Amazonas, guerreiras da mitologia grega, são a reencarnação das almas de mulheres mortas pela violência de homens, reunidas no útero da mãe de todos os Deuses, Gaea, e libertas ao mundo pelas principais Deusas do panteão olimpiano aquando do inicio da perigosa ascensão de Ares, filho de Zeus e Deus da Guerra. Durante anos seriam as pregadoras da mensagem de paz dos Deuses, até caírem em desgraça fruto de uma conspiração orquestrada por Ares. Porque não permaneceram fieis aos seus ensinamentos de paz, fraternidade e prosperidade, acabaram exiladas na ilha de Themyscira, oculta dos olhares do mundo e isenta do passar do tempo.


Contudo, Hippolyta, a sua rainha, permanecia com uma ansiedade no porte. Quando da sua morte, uma filha crescia-lhe no útero. Mas as Deusas, complacentes com a sua súbdita, decidiram conceder-lhe o seu mais profundo e irreconhecido desejo: o nascimento da filha. A mando, Hippolyta dirigiu-se às praias de Themyscira, com o barro das quais esculpiu a forma virginal de uma criança. Então, Demeter, Afrodite, Atena, Artemisa, Hestia e Hermes (o único homem), deram o dom da vida à pequena princesa de Themyscira, Diana, bem como outras dádivas: o poder e força da Terra; a beleza e um coração carinhoso; sabedoria; olho de um caçador e a comunhão com os animais da terra; o poder da palavra e da verdade; velocidade e harmonia com o ar através do livre voo.


Diana cresceu inocente para o mundo, educada nos princípios justos, democráticos e pacíficos da cultura amazona, herdeira dos mais elevados fundamentos da cultura helénica, mãe da civilização ocidental. Mas chegou um dia em que Ares, tecedor do exílio das Amazonas, fez-se uma vez mais conhecido através das suas artimanhas e artifícios. E em Diana, instigada por Atena, cresceu uma vontade de lutar pelo mundo que ama acima de todas as coisas. E assim parte ela para o mundo patriarcal, o mundo exterior, o dos homens, munida de uma missão de paz mas preparada para enfrentar a guerra. Assim nasceu para o mundo a Mulher-Maravilha, a guerreira da paz.


Ao longo destes mais de 20 anos da nova incarnação, Diana de Themyscira declarou-se como um dos mais interessantes personagens da BD americana. Ela faz parte do panteão dos chamados super-heróis mas tornou-se, no universo ficcional da DC Comics, em algo mais. Ela é a embaixadora da paz, a super-heroína que prefere a palavra e a pena à espada e ao punho. E nisso provavelmente reside um dos seus maiores desafios. Como escrever ficção de aventura com um personagem que, na maior parte dos casos, tenta raciocinar com os adversários? Como escrever uma mulher perfeita, bela, forte e extraordinariamente inteligente num mundo fortemente falhado e de criaturas que necessitam de personagens com quem se identificar, como que na busca de uma outorgarão das suas falhas?


Diana também ela é um pastor e não uma líder, ainda que a sua herança Real nos faça tremer um pouco na sua presença. Ela pega-nos nos braços fortes da verdade das suas palavras e empurra-nos um pouco mais colina acima.


Diz-se ainda que ninguém que esteja perto de Diana consegue mentir (bem, depois da sua “morte”, ressuscitou como a Deusa da Verdade. Raramente um título foi tão apropriado!). Isso torna-a num ser perigoso, principalmente num mundo onde as aparências, as pequenas e as grandes mentiras são o pão nosso de cada dia e o nutriente para a vida de muitos. E ninguém gosta de ser lembrado da sua falácia.


Poderia estar aqui incontáveis parágrafos a falar de um dos personagens de BD que considero mais interessante (para mim talvez o mais interessante), mas para quê? Não dizem que a verdade vem sempre ao de cima? Pois bem, um dia será a vez de Diana de Themyscira, conhecida pelo mundo patriarcal como a Mulher-Maravilha.

1 comentário:

Nuno Amado disse...

É na verdade super interessante a Mulher Maravilha! Penso que é a única revista dos comics norte-americanos que tem como personagem principal uma mulher e nunca foi descontinuada. A Marvel tentou também ter a sua Wonder Woman, mas nunca conseguiu!
Devido à sua atitude pacífica, quando Diana enverga a sua armadura de batalha, é sempre uma situação muito emocionante e sabemos que vai haver "tareia" a rodos!

Abraço