Crónicas de Gelo e Fogo de George R.R. Martin


George R. R. Martin não é John R.R. Tolkien.


Não entendam esta afirmação apenas como uma crítica mas também com um elogio.

Tolkien foi o pai e o precursor de um estilo, obreiro de uma das mais importantes heranças literárias do século XX e da humanidade, digno de ombrear com outros tecedores de mundos dignos de nota. George Martin, pelo menos até o momento, não deu origem a nenhum estilo, antes se sentiu inspirado por muitos.

Mas Martin também não seguiu cegamente as peugadas do pai e de sua prol (e foram uma legião), antes tem consistentemente aberto os seus trilhos, sem medo de encontrar um ou outro abismo sobre o qual teimosamente insiste em construir uma ponte. E esta é uma das forças maiores de George Martin: unir mundos (literários) de uma forma fresca.

O mundo que Martin criou não foge ao sonho de muitos dos que avidamente lêem este tipo de romance com vários epítetos: Alta Fantasia; Romance de Cavalaria; etc. Mas fá-lo de uma forma idiossincrática, deixando o universo respirar lenta e pausadamente antes de o mergulhar no deslumbramento do fantástico. O primeiro volume das “Crónicas de Gelo e Fogo” chamado “A Guerra dos Tronos” (que em Portugal foi dividido em dois pela editora Saída de Emergência) não possui quase nenhuma referência ou episódio sobrenatural. Antes imiscui-se de uma forma conhecedora nos meandros de um mundo medieval onde a intriga palaciana é rainha e senhora (o trocadilho é intencional).

Os vários intervenientes (e Martin recorre ao recurso estilístico de cada capítulo ser contado no ponto de vista de um dos seus personagens) perdem-se em rebuscados enredos de busca incessante e tão humana por poder, justificando-o por uma miríade de razões mas sempre com o intuito vergonhosamente egoísta: conseguir mais para mim, para a sobrevivência que, ironicamente, acaba abruptamente. Com o cravar de um punhal, figurativo e não só, nas costas.

Martin excede-se nestes retorcidos caminhos, agarrando o leitor de forma voyeurista. Os seus personagens não são excessos de bravura e nobreza. É raro um que o seja. E, ainda assim, insistimos em vê-los em cair...

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