The Favourite (A Favorita) de Yorgos Lanthimos

A ascensão do realizador grego Yorgos Lanthimos tem sido nada menos que meteórica. Começou com filmes trabalhados na sua terra natal, Dogtooth e Alps, para logo ser reconhecido no além-fronteiras e lançar outros dois, The Lobster e The Killing of a Sacred Deer, que o fixaram como um dos realizadores a acompanhar. Nestes dois últimos já figuravam alguns actores conhecidos internacionalmente, com Colin Farrel a bisar, acompanhado de Rachel Weisz no primeiro e de Nicole Kidman no segundo. Ambas estas obras eram esforços surrealistas, que não se enquadravam no cinema mainstream, antes devendo méritos à inspiração de lendas como Buñuel e até a um David Lynch mais contido.


The Favourite, o seu último filme, candidato a vários Óscares e vencedor de outros prémios como os BAFTA, é um bicho bem diferente - e é-o a vários níveis. Acompanha a história de uma frágil rainha na Inglaterra do século XVIII, Anne, interpretada pela brilhante Olivia Colman, e da sua relação com duas aias e amigas, interpretadas pela repetente, às mãos de Lanthimos, Rachel Weisz, e por Emma Stone. É a história do conflito de poder entre estas duas últimas pelo afecto e proximidade da primeira, um confronto que influencia também a política interna e externa do país. É uma história feita por mulheres, mas que não se cinge a esse mundo, antes escapa para a universalidade do conflito humano. Por outro lado, é uma obra que, pela sua linearidade narrativa, rompe os moldes dos seus filmes anteriores. Mas, ficam avisados: esta não é a típica narrativa hollywoodesca candidata a Óscar. Lanthimos afirma, de forma resoluta, os seus predicados de auteur e filma sem desculpas por essa sua assinatura.

O realizador grego começa por nos colocar pouco à vontade, ao escolher a grande angular para muitos dos planos deste filme. Apropriada ao ambiente luxuoso e sumptuoso da corte, oferece, ao mesmo tempo, uma desnaturalidade desconcertante e cómica. Sabemos estar de frente para o palco de teatro e, simultaneamente, de olho numa desconcertante realidade. Já em The Killing of a Sacred Deer, Lanthimos optava por planos abertos e com uma mise en scéne que namorava a estranha fronteira entre o real e a ficção. Em The Favourite assumo-o ainda mais. A luz escolhida é quase sempre a natural do dia, do interior do palácio ou a das velas, numa opção que chega a assemelhar-se à do lendário Barry Lyndon de Kubrick, realizador que (juraria) é uma forte influência no trabalho deste - lembrem-se que Lyndon foi filmado sempre com luz natural. Toda esta ambiência, ainda que totalmente alicerçada no mundo real, não deixa de cheirar a surreal, como se um sopro de alucinogéno navegasse pelo ar dos protagonistas. 

Lanthimos fez um filme que pouco tem de Óscar. Fez um filme na linha da sua inspiração. E fez um filme fabuloso. E, já agora, as três actrizes estão brilhantes. Assim vale a pena ir a uma sala de cinema.

Sem comentários: