Há quem diga que os floppies americanos estão a morrer (panfletos, como lhes chama um amigo; comics, como todos os conhecem). Eu cá espero que não porque adoro agarrá-los e devorá-los! É prazer que rezo para nunca acabar. Assim sendo, de vez em quando, vou escrever umas breves palavras sobre alguns que gostei de ler. Só isso. Gostado! Não são melhores nem piores que outras coisas.
Extremity números 1 a 10 de Daniel Warren Johnson (Skybound e Image)
Já o ouvi várias vezes. Escrevam sobre aquilo que conhecem. Acredito nesta máxima. As palavras e os conceitos tendem a fluir mais facilmente quando falamos das nossas vidas, ou melhor, das nossas perspectivas. Mas não é, decididamente, apenas isso. Para o leitor, espectador ou ouvinte, a mensagem tende a tornar-se mais verdadeira, mais, paradoxalmente, universal. Apercebemos-nos, racional e emocionalmente, da honestidade das palavras, das imagens ou dos sons. É difícil de quantificar. Fácil de sentir. Este é o maior elogio que posso escrever sobre este Extremity de Daniel Warren Johnson, publicado em conjunto pela Skybound e pela Image.
Esta BD figurou em algumas das listas das melhores de 2017 e a minha curiosidade foi atiçada. Li os dez primeiros capítulos e fui imediatamente agarrado pela premissa e, principalmente, pela honestidade emocional com que o criador veicula esta estranha aventura num mundo alienígena. Sim, ele nunca viveu num mundo extra-terrestre e muito menos no que parece ser um futuro pós-apocalíptico. Mas o worldbuilding é sólido e as personagens baseadas na experiência pessoal do autor. As vozes delas são a sua voz. As palavras lêem-se com sentimento de veracidade, ainda que estejamos a dimensões de distância da nossa realidade.
Extremity passa-se num mundo de ilhas flutuantes, após uma catástrofe, onde várias tribos humanas degladiam-se pela sobrevivência e pela vingança. Uma mistura de Senhor dos Anéis e de Avatar. Incrivelmente dinâmico e cinético, com cenas de acção poderosas, bem-coreografadas, rápidas e muito violentas. Mas desenganem-se os que lêem "violência" e inflectem logo para gratuitidade. Existe ressonância emotiva em cada golpe dado e em cada gota de sangue derramada. E as mensagem e os momentos de paz são os que ajudam a sublinhar a violência extrema que lhes segue ou antecede.
Uma das grandes BDs em publicação na actualidade. Emoção em ecrã gigante.
The Wildstorm números oito a dez de Warren Ellis e Jon Davis-Hunt (Wildstorm e DC Comics)
Uma das razões porque sou um apaixonado (mas não um fanático) pela editora DC Comics são as histórias e séries publicadas mais ou menos entre meados da década de 80 e meados da primeira do século XX. Vinte anos de risco que deram algumas das mais emblemáticas BDs da minha vida, fora e dentro do mundo dos super-heróis. Foi com pesar que assisti à lenta queda da qualidade e inclinação adulta da editora (coincidente com a entrada do editor-chefe Dan Didio). Mas é com igual alegria que, recentemente, tenho recuperado a fé que tinha na maturidade das escolhas da DC. Começou com vendas fracas e com a reacção a elas: DC Rebirth - o electrochoque dado à ala dos super-heróis; experimentações como Young Animal; as personagens da Hanna Barbera; o ressurgimento da linha Elseworlds; e este Wildstorm.
Wildstorm pertencia ao autor Jim Lee, um dos fundadores da Image no início da década de 90, e era uma das subdivisões dessa mítica editora. Anos mais tarde, separar-se-ia da casa-mãe e acabaria por ser adquirida pela DC Comics. Há semelhança de outras aquisições, as personagens de vertente super-heroística seriam absorvidas pelo universo do Super-Homem e afins, passando a viver aventuras conjuntas (o evento Novos 52 de 2011, onde a editora começava tudo do zero, serviu para juntar os mundos da DC e da Wildstorm). Eis que se passam meros sete anos e Jim Lee decide voltar a isolar o seu universo e entrega as rédeas criativas ao escritor Warren Ellis, autor de alguns dos maiores sucessos da Wildstorm antes da junção com a DC: Authority; Planetary; para citar dois favoritos pessoais e obras de reconhecida importância sísmica.
Ellis decidiu recomeçar zero e contar um épico em 24 partes. As personagens são reconhecíveis para quem leu algo da antiga Wildstorm, mas é apenas isso: familiaridade. De resto, nada têm a ver. Como o zeitgeist deste meio da década de 10 do século XXI é outro, o escritor inflecte a escrita para uma sensibilidade ultra-tecnológica, sem perder a sua assinatura super-sónica, focando-se em personalidades duras, ultra-competentes e perigosamente sarcásticas. O mundo deste The Wildstorm é um mundo Ellisiano, de conspirações, de pouca fé na natureza humana e de risco constante à escala multiuniversal. A violência, à semelhança de Extremity é, desculpem o trocadilho manhoso, extrema, coreografada e assustadoramente bela. Arrisquem-se a ler mas façam-no de uma assentada. Porque esta é do tipo de séries cuja complexidade apela a uma leitura atenta e focada. Finalmente, não é todo de descurar o trabalho do desenhista Jon Davis-Hunt, uma surpresa em capacidade de desenho e do contar de uma história. A coreografia não seria a mesma.
Uma das razões porque sou um apaixonado (mas não um fanático) pela editora DC Comics são as histórias e séries publicadas mais ou menos entre meados da década de 80 e meados da primeira do século XX. Vinte anos de risco que deram algumas das mais emblemáticas BDs da minha vida, fora e dentro do mundo dos super-heróis. Foi com pesar que assisti à lenta queda da qualidade e inclinação adulta da editora (coincidente com a entrada do editor-chefe Dan Didio). Mas é com igual alegria que, recentemente, tenho recuperado a fé que tinha na maturidade das escolhas da DC. Começou com vendas fracas e com a reacção a elas: DC Rebirth - o electrochoque dado à ala dos super-heróis; experimentações como Young Animal; as personagens da Hanna Barbera; o ressurgimento da linha Elseworlds; e este Wildstorm.
Wildstorm pertencia ao autor Jim Lee, um dos fundadores da Image no início da década de 90, e era uma das subdivisões dessa mítica editora. Anos mais tarde, separar-se-ia da casa-mãe e acabaria por ser adquirida pela DC Comics. Há semelhança de outras aquisições, as personagens de vertente super-heroística seriam absorvidas pelo universo do Super-Homem e afins, passando a viver aventuras conjuntas (o evento Novos 52 de 2011, onde a editora começava tudo do zero, serviu para juntar os mundos da DC e da Wildstorm). Eis que se passam meros sete anos e Jim Lee decide voltar a isolar o seu universo e entrega as rédeas criativas ao escritor Warren Ellis, autor de alguns dos maiores sucessos da Wildstorm antes da junção com a DC: Authority; Planetary; para citar dois favoritos pessoais e obras de reconhecida importância sísmica.
Ellis decidiu recomeçar zero e contar um épico em 24 partes. As personagens são reconhecíveis para quem leu algo da antiga Wildstorm, mas é apenas isso: familiaridade. De resto, nada têm a ver. Como o zeitgeist deste meio da década de 10 do século XXI é outro, o escritor inflecte a escrita para uma sensibilidade ultra-tecnológica, sem perder a sua assinatura super-sónica, focando-se em personalidades duras, ultra-competentes e perigosamente sarcásticas. O mundo deste The Wildstorm é um mundo Ellisiano, de conspirações, de pouca fé na natureza humana e de risco constante à escala multiuniversal. A violência, à semelhança de Extremity é, desculpem o trocadilho manhoso, extrema, coreografada e assustadoramente bela. Arrisquem-se a ler mas façam-no de uma assentada. Porque esta é do tipo de séries cuja complexidade apela a uma leitura atenta e focada. Finalmente, não é todo de descurar o trabalho do desenhista Jon Davis-Hunt, uma surpresa em capacidade de desenho e do contar de uma história. A coreografia não seria a mesma.
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