A Banda Desenhada, tal como a maior parte das obras produzidas em diferentes artes, tem sido bastante etnocêntrica. Para o ponto que quero aqui aludir irei apenas focar-me neste centrismo, já que a BD é conhecida pela pouca diversidade de género, de religiões, de opções sexuais. Por força destes tempos mais plurais, democráticos e informados, a diversidade é, cada vez mais, a palavra de ordem. Daí que mesmo editoras tradicionais como o são a Marvel e a DC Comics, ambas conhecidas pelos seus super-heróis, iniciaram um movimento interno de abertura, que se tem traduzido na criação e introdução de novos protagonistas ou mesmo na releitura dos seus antigos, tudo pelo olhar de novas lentes - ou melhor, lentes que sempre existiram mas que raramente eram utilizadas. Um dos exemplos com maior sucesso, ao mesmo tempo de vendas e de crítica, é Kamala Khan, a segunda Ms. Marvel.
Kamala Khan é uma jovem habitante de Nova Jérsia, de ascendência paquistanesa e muçulmana. Um dia é atingida por uma estranha neblina que contribui, junto com um gene muito especial de que é herdeira, para uma transformação, transformação essa que a empurrará para o caminho do panteão dos super-heróis do mundo Marvel. Resoluta e opinada, é amante dos super-seres da cidade em que habita, escrevendo fanfiction cujos protagonistas são os seus poderosos ídolos. Dotada de um forte e apurado sentido de justiça, é fã em especial de Ms. Marvel, uma das maiores heroínas deste universo fictício. Porque entretanto este seu ídolo muda de nome para Capitã Marvel, Kamala decide assumir o legado, ser a nova Ms. Marvel e a nova protectora do subúrbio de NY em que vive. Isto ao mesmo tempo em que transforma-se na porta-estandarte de um modo de pensar o heroísmo que parecia longe da inclinação dos millenials dos quais faz, assumidamente, parte. O que parece ser "too good to be true" é, na realidade, um grito dos criadores a favor da diferença, do multiculturalismo, da multi-religiosidade, num tempo e numa era onde o que parecia estar assegurado afinal não está. Um mundo que parecia estar a caminhar para uma assumida pluralidade de pontos de vista, mas que o terrorismo e o ressurgimento de políticas menos globalizadas e fracturantes puseram em causa essa mudança de paradigma. Kamala representa a busca desesperada para respeitar-mo-nos nas diferenças sem pregar mensagens, antes as mostrando de forma discreta mas vivida. Aliás, este tipo de narrativa é fruto da forma como os autores G. Willow Wilson e Adrian Alphona constroem a história mas é também fruto de uma filosofia: pregar não funciona, tornar relacionável, sim.
O sucesso de Kamala não se ficou pelas terras do Tio Sam e exportou-se para a França, por exemplo, onde esta BD venceu a Fauve d’Angoulême 2016 – Prix de la Série. Num país que, como os EUA, também partilha dos mesmos problemas sociais, raciais e religiosos, Ms. Marvel é muito mais que relevante. Também dentro do universo fictício da Marvel, Kamala tem elevado o seu estatuto, não só pela participação em grupos de super-heróis como os Vingadores e os Campeões (Champions é mesmo uma das mais interessantes séries da Marvel neste momento) mas essencialmente pela sua filosofia em relação ao heroísmo. Ms. Marvel é uma BD sobre e para millenials misturada com heroísmo old school. Uma combinação que é mais do que perfeita: é necessária.
O sucesso de Kamala não se ficou pelas terras do Tio Sam e exportou-se para a França, por exemplo, onde esta BD venceu a Fauve d’Angoulême 2016 – Prix de la Série. Num país que, como os EUA, também partilha dos mesmos problemas sociais, raciais e religiosos, Ms. Marvel é muito mais que relevante. Também dentro do universo fictício da Marvel, Kamala tem elevado o seu estatuto, não só pela participação em grupos de super-heróis como os Vingadores e os Campeões (Champions é mesmo uma das mais interessantes séries da Marvel neste momento) mas essencialmente pela sua filosofia em relação ao heroísmo. Ms. Marvel é uma BD sobre e para millenials misturada com heroísmo old school. Uma combinação que é mais do que perfeita: é necessária.
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