Hoje não sinto-me particularmente inspirado e só apetece-me dizer um lugar comum: este não é, de longe, o melhor filme de Tarantino; não é, sequer, um dos seus melhores; mas queria muito realizador fazer filmes com esta qualidade.
No Inverno gelado de Wyoming, EUA, um caçador de recompensas (Kurt Kussel) capturou uma mulher com a cabeça a prémio (Jennifer Jason Leigh). O seu destino é a aldeia de Red Rock, onde ela será julgada e enforcada. A caminho, encontra um outro caçador de recompensas (Samuel L. Jackson) e o futuro Xerife da dita aldeia (Walton Goggins), a quem, de forma muito relutante, oferece boleia até uma "retrosaria", onde esperam abrigar-se de uma tempestade. Chegados à dita retrosaria (que é mais um mercearia/pousada/bar), onde terão de ficar por dois ou três dias, ao invés de encontrarem os donos, que conhecem, dão de caras com um mexicano, um velho, um escritor e um carrasco. O cenário está composto, o palco montado, o pano pode levantar-se. Esta minha pobre analogia ao Teatro tem um propósito que, tanto quanto eu sei, nem sequer é original: Tarantino construiu, com Os Oito Odiados, uma peça de teatro.
Tarantino é, sem esforço, um dos actuais grandes realizadores do mundo. Tem uma assinatura, um estilo imediatamente tão reconhecível que já deu origem a um adjectivo. Um filme pode ser Tarantinesco sem ser do Tarantino. Uma das suas tarantinesadas são os diálogos: verborreicos, redondos, ricos, profanos. No fundo, já seguia a longa tradição shakespeariana de dar importância ao que sai da boca dos personagens porque, ao contrário da prosa, são (também) neles que revelam-se as personalidades (é claro que o outro factor são os actores, tão ou mais importantes). Ora, nada mais natural que Tarantino tenha feito o seu primeiro filme assumidamente teatral e que tenha já referido que, no futuro, fará apenas mais dois filmes e passará a encenar peças de Teatro como expressão da sua Arte.
Nesta forma de filmar o seu argumento, Tarantino prova, uma vez mais, ser um realizador de excepção. O filme, a início, esforça-se demais e (confesso) cheguei a temer que adormeceria. Nos primeiros momentos da "retrosaria" não reconheci o realizador que tanto gosto. Contudo, quando começa a matança (e vocês sabem que num filme de Tarantino tem de existir matança) o palco parece não ser suficiente para conter aquelas personalidades maiores que a vida. Reflecte-se os EUA de hoje e de sempre num western encenado como peça de teatro. Uma vez mais o racismo é abordado mas, desta vez, Tarantino mistura as terras sem lei da fronteira, a posse de armas (que compreende-se aqui porque existe na Constituição dos EUA) e a história de uma carta. Tudo para construir um filme que é seu, sem dúvida, mas que acrescenta algo de novo no seu extraordinário currículo.
Para mim, já tenho um dos filmes de 2016.
Sem comentários:
Enviar um comentário