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A DC Comics,
depois da sua reinvenção de 1986, começou a entregar os personagens a
diferentes autores para que estes dessem espaço à sua criatividade. Desta
“generosidade” nasceram algumas das mais memoráveis obras a agraciar a 9.ª
Arte. Existiu mesmo oportunidade para que alguns criadores contassem histórias
muito pessoais e que o pudessem fazer com um princípio, meio e fim, algo muito
difícil na infinita telenovela dos super-heróis. Sugiro, por exemplo, Starman de James Robinson e Tony Harris,
Hitman de Garth Ennis e John McGrea e
agora este Spectre de Ostrander e
Mandrake.
Nunca tinha tido o prazer de ler esta BD mas há muitos anos
que a andava a namorar. A DC, finamente, começou a colecionar algumas das mais
emblemáticas BD de qualidade que tem no seu portfólio e este primeiro volume
compila os 12 primeiros números da revista mensal (se bem que anseio pelo dia
em a editora faça o mesmo que a Marvel
e começa a sua própria Epic Collection).
A vantagem deste volume, além da qualidade dos dois autores, é tratar-se de uma
história finita e completa que se desenrola ao longo do livro. Com certeza terão
de saber alguma coisa acerca do personagem principal mas parece-me que tudo o
que há de importante para saber está já contido dentro das suas páginas. O personagem
principal é Jim Corrigan, um polícia falecido
desde a década de 40, e o seu alter-ego, o (literal) anjo da vingança do deus judaico-cristão,
chamado Espectro. A título de pequena
mas não essencial introdução, o personagem existe desde a década e 40 na BD,
fazendo parte integrante do primeiro grupo de super-heróis de sempre na história
da arte, a Sociedade da Justiça. Ao
longo das décadas que se seguiram teve algumas tentativas de projetos a solo
mas, na maior parte das aparições, sempre funcionou melhor como coadjuvante (duas
das mais emblemáticas aparições foram no maravilhoso Swamp Thing de Alan Moore e na Crise nas Terras Infinitas). Portanto, este primeiro trabalho da dupla
Ostrander/Mandrake é também o primeiro de renome com o personagem, tendo ganho,
ao longo dos últimos anos, um estatuto de lenda e qualidade para os
apreciadores do género. Género que está um pouco longe do super-herói.
The Spectre de
Ostrander e Mandrake navega aquelas maravilhosas águas de fronteira entre um
oceano mais mainstream dos super-heróis
e o mais “maduro” da Vertigo, a famosa
sub-editora da DC que publicou obras importantíssimas como Sandman e 100 Bullets. De
facto, percebemos que o personagem navega pelo universo normal dos super-heróis,
não se afastando desse porto (estou a esticar a metáfora, parece-me), mas entra
resoluto num ambiente mais negro, o do horror. Ambiente esse ao qual não só o
personagem empresta-se sem problemas como, principalmente, o maravilhoso
desenho de Mandrake, que revela-se nesta obra com todo o seu esplendor. A violência
de um personagem que representa a ira do deus judaico-cristão remonta à imagem
que temos do Antigo Testamento, uma cegueira sanguinária preocupada com o preto
e o branco e pouco com cinzento da natureza humana. Contudo, na habilidosa
mente de Ostrander, essa polarização é complexa e não perde ainda um átomo do
entretenimento tão essencial ao mundo dos super-heróis.
Os anos de espera compensaram e pergunto-me como é que não
li isto mais cedo - ando a ter esta consciência em relação não só a este
trabalho mas também a outros como Thor,The Eternals Saga e muito em breve vão ver que também com o sublime Miracleman. Ainda bem que a DC vai
continuar a colecionar este Spectre de Ostrander e Mandrake.
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