Coleção Levoir/Público Marvel 2014 – 9.º Volume: X-Men

(Prometo informar os menos conhecedores acerca da acessibilidade desta coleção de BD, ou seja, se é fácil ou não ler sem saber mais coisas)

Grau de acessibilidade: Médio para o Fácil

Sai amanhã, Quinta-feira, dia 4 de Setembro, junto com Público e custa 8,9€

Em 1981 foi previsto que 2013 seria o ano da morte dos X-Men, a famosa equipa de super-heróis da editora de BD americana, a Marvel. Todos eles mutantes que, segundo este universo ficcional, são o passo seguinte na evolução da humanidade, seriam exterminados num momento da história em nada diferente do Holocausto. A equipa estava no auge da popularidade, totalmente por culpa de dois artistas, Chris Claremont (escritor) e John Byrne (escritor e desenhista), que desde 1975 e 1977, respectivamente, produziam histórias que viriam a ser consideradas um marco, não só pela qualidade da colaboração, mas também por apresentarem alguns dos momentos mais relevantes, icónicos e transformadores da BD americana.

A parelha tinha acabado de sair de um desses momentos, ao produzir uma das suas mais importantes histórias, em que haviam sido forçados a matar um relevante personagem dos X-Men na intitulada “Saga da Fênix Negra” (publicada também Levoir-Público). O que poderia ser visto por qualquer outro como um apropriado canto do cisne, na realidade serviu como acha para uma fogueira que arderia ainda por mais alguns meses. Nasceria Days of Future Past.

O enredo à data era algo de particularmente inovador na BD americana. Durante dois números mensais, os 141 e 142 da revista Uncanny X-Men, a equipa dividiu o protagonismo das páginas da revista com uma sua versão futura. Daí a 30 anos, o governo norte-americano havia aprovado uma lei que bania a existência dos chamados mutantes, os homo superior, relegando-os a um papel de párias, perseguidos por todos em geral e por gigantescos robôs sentinelas em particular, caçadores implacáveis e velhos inimigos dos X-Men. Aquilo que representavam, as minorias, a luta pela afirmação da diferença, os direitos dos excluídos, era sublinhado e hiperbolizado, ao comparar a sua luta com o sofrimento infligido a tantos outros ao longo da História da humanidade. Comparava-os à perseguição e purga que havia sido sanguinariamente perpetrada a tantos outros no passado. Depois de caçados como sub-humanos, eram atirados para campos de concentração, forçados a viver em condições que espelhavam o racismo e desprezo que inspiravam nos seus semelhantes. Deste futuro distópico é trazida para o presente a mente de um dos X-Men, que tenta usar o seu corpo de 1981 para impedir que aquele 2013 tenha lugar.

A luta no presente adquiria um peso diferente. Os X-Men não lutavam apenas contra o vilão do momento ou o inimigo figadal, lutavam pelo futuro da sua raça, um futuro que se desenhava negro, o reflexo distorcido do sonho que os havia inspirado a unir-se, o da irmandade entre todos os homens. Este conflito era genialmente sublinhado pelos criadores, ao forçarem no presente de 1981 um combate tipicamente “super-heróico”, mas desta feita contra um grupo de mutantes terroristas que, não acreditando na filosofia pacifista dos X-Men, procuravam uma defesa mais militarista dos direitos que acreditavam ser seus. Deste modo, os protagonistas são colocados numa área cinzenta de moralidade, fornecendo diferentes pontos de vista e aproximações a um mesmo problema. A conclusão, à data, foi particularmente dura e surpreendente, porque as versões dos X-Men de 2013 sofriam um destino nada risonho. A luta dos principais personagens assumia-se, uma vez mais, como multidimensional e facetada. O futuro era verdadeiramente trágico e nessa dimensão Chris Claremont e John Byrne saíam vitoriosos e inovadores. Os X-Men assumiam-se como personagens de uma tragédia clássica, em que o destino inexoravelmente os dirigia para um fim negro, apesar de todos os esforços, apesar de todos os sacrifícios.

Este volume da Levoir coleciona esta história mas não só. Junta os derradeiros e históricos momentos da mítica colaboração entre Claremont e Byrne: o regresso de Wolverine à sua terra natal, o Canadá; as boas-vindas de Kitty Pryde ao escola dos X-Men; a elegia de Jean Grey, a Fênix Negra. Isto é para lá de essencial, é lendário e objecto de teses de doutoramento sobre a BD.


Nota final – Eu não partilho da opinião que se tem de saber tudo para acompanhar bem uma história. Parte da “magia” da BD americana reside na descoberta posterior, na paciente reconstrução do puzzle. Mas para aqueles que não têm tempo e paciência aqui fica este meu pequeno esforço.

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