O meu MOTELx 2015 - Goddess of Love, Roar e Scherzo Diabolico



O género do terror na 7.ª Arte é geralmente associado a monstros, sangue, tripas, zombies e outras estéticas que tais. Contudo, como bem prova este MOTELx (já aqui falei das edições de 2013 e 2014), o festival de terror de cinema de Lisboa, nem sempre temos de ver um ser humano a ser esquartejado ou perseguido por uma abominação da natureza para que tenhamos algo que nos faz arrepiar e contorcer na cadeira. Por acaso do destino, três dos primeiros filmes que vi na edição deste ano estiveram perto deste sub-género, mais amplo e menos definido. Em alguns houve sangue, sim, em outros existiram assassinatos, também, mas os monstros não eram o Diabo mas antes criaturas muito humanos (em todos os casos).

Goddess of Love de Jon Knautz é um thriller sobre uma doença. Venus é uma mulher com um grave problema mental, que faz a sua vida normalmente, oscilando entre a reclusão numa casa decorada de forma sui generis e uma profissão de dançarina exótica. Numa das suas exibições conhece um homem por quem prontamente se apaixona de forma profunda, espelhando mais a sua carência emocional e menos uma perdição romântica. O filme depressa oscila entre a exploração da demência da jovem mulher e esparsos episódios que (aí sim) envolvem mortes e sangue. Não sendo uma exploração particularmente original da doença (por vezes é até carnavalesca), acaba por ser interessante, desviando-se aqui e acolá de alguns tiques narrativos mas, ainda assim, sem particular genialidade. Vale, muitas vezes, pela interpretação de Alexis Kendra, a titular deusa do amor e menos pelos atributos do realizador. Só não havia necessidade era de fazer "mal" a um pequeno gato.

Por falar em felinos, aconteceu neste MOTELx 2015 o objecto estranho que é Roar de Noel Marshall, conhecido por ser o produtor de um dos maiores filmes de terror de sempre, O Exorcista. Roar vale não tanto pela história em si mas pela novela da produção e pelo facto de justificar ou não o epíteto de ser "o filme mais perigoso de sempre". Porquê? A película tem como actores principais uma impressionante quantidade de felinos de grande porte, sem qualquer tipo de treino "oficial", a contracenarem com outros, mas estes humanos  - e estamos a falar de Tippi Hedren, do maravilhoso Pássaros do mestre Hitchcock, ou de Melanie Griffith no início de carreira. Já não bastava a Hedren ter tido uma carreira marcada pelos maus tratos psicológicos do realizador de Psycho como é perseguida por leões, tigres, pumas, leopardos, todos em convívio (na maior parte das vezes) pacífico. Estes grande felinos vivem e são criados por Marshall, que interpreta o pai da família, numa mescla perfeita entre serem os animais que são e uma convivência brincalhona com os humanos. Em suma, estamos a falar de gatos gigantes e, quem vive com esses animais, sabe que gostam de brincar, ronronar, aninhar-se no colo e arranhar. E se uma arranho de gato pode aleijar imaginem o de um leão. Daí o título de filme mais perigoso de sempre, já que nenhum dos animais foi ferido mas 70 dos membros da equipa não podem dizer o mesmo. Vale não só pela estranheza do objecto mas, principalmente, por poder ver-se estes belíssimos animais com comportamentos que raramente lhes atribuímos.

Finalmente, Scherzo Diabolico do realizador Adrián García Bogliano, acaba por ser, dos três, o mais similar à clássica narrativa de terror, ainda que sem o elemento do sobrenatural e antes com uma situação bem humana. Um pai de família esforça-se no seu trabalho mas sem a recompensa monetária proporcional. É pressionado pela mulher para que as horas longas materializem-se em dinheiro. Enceta então um plano que envolverá o seu patrão e que, de uma forma ou de outra, redundará numa espiral de violência e tragédia. Dos filmes que vi até agora é aquele que mais fortemente se alicerça no enredo, no clássico "o que vai acontecer de seguida"   mas com um forte pendor sociológico e antropológico por espelhar uma realidade muito actual do Mexico (de onde este filme é originário). No final, na minha opinião, o realizador pende a narrativa para escolhas um pouco deslocadas da estética optada, quase que a transformando em humor, mas de uma forma geral é um filme recompensador.


Sem comentários: