Porque é que sempre que dizemos que fomos ao cinema invariavelmente é subentendido que vamos para ver um filme americano? Em jeito de verdade, é costume muitos dizerem que foram ver uma "americanada" mas, vamos ser completamente honestos, isso acontece muito? Quantas vezes é que uma pessoa diz "vou ver um filme francês", ou "filme alemão", ou, pior, "vou ver um filme de vampiros iraniano"? E, se são daqueles que o dizem, qual é, inevitavelmente, a reação? "Francês? Que seca! deve ser uma xaropada intelectual qualquer!". "Filme iraniano de vampiros? Isso sequer existe? Deve ser uma porcaria". Contudo, não hesitamos um segundo sequer em dar o benefício da dúvida a um qualquer filme que seja falado na língua oficial do cinema, o "americano". Todas as outras línguas, portuguesa inclusive, são parte do segmento de mercado conhecido como "cinema estrangeiro" ou, pior, "cinema alternativo". Por causa destes preconceitos (é isso mesmo que são) perdem-se, sim, filmes intelectuais ou alternativos, e, também, pérolas como este A Família Bélier, um lindíssimo e bem disposto filme proveniente de França.
(Quando digo "proveniente" não o faço por acaso.)
Sinto-me muito mais próximo da cultura francesa do que da americana. Já aqui o disse em outros posts. A forma como os franceses se relacionam em família, o modo como comem, a forma como se comportam socialmente, é (quase) igual à nossa. Não só são latinos como europeus. A proximidade da narrativa francesa, principalmente em filmes como este, toca-me sempre de forma mais duradoura. A Família Bélier é uma deliciosa comédia familiar passada em França que, com um pequeno toque ou outro, poderia facilmente passar-se em Portugal. Uma rapariga dotada com uma voz excepcional, vive no campo junto com a sua família surdo-muda, de quem é um pilar de contacto com o mundo e de ajuda na actividade rural. Mas o dom vai abrir-lhe as portas de Paris e a uma vida diferente. Obrigatoriamente, gera-se um confronto que terá de ser solucionado ao longo das quase duas e deliciosas horas deste fabuloso filme. Escritas e desenhadas com sensibilidade europeia, pouco ou nada dada ao politicamente correcto, a uma artificialidade imposta por uma agenda social ascética que cria filmes iguais uns aos outros e que, muito sinceramente, inevitavelmente acaba por afastar as pessoas do Cinema.
Este não se trata de uma obra do Cinema intelectual, mas um filme que aconselho a todos os que querem passar umas boas duas horas. Desloquem-se à sala mais próxima que o passe e, garanto-vos, não vão-se arrepender.
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