Blackhat de Michael Mann

Desde de Colateral e Miami Vice que Michael Mann me tem como fã. Antes destes já tinha visto Heat, mas provavelmente ainda não estava preparado para a linguagem deste realizador e o filme não me atingiu da mesma forma que os dois outros. Inimigos Públicos tinha sido um pequeno desvio, um acidente de percurso, mas não suficientemente aparatoso para me esquecer das paisagens pontilhadas pelas luzes das neo-cidades norte-americanas semi-iluminadas pela quase-madrugada. Não o suficiente para me esquecer das histórias de amor começadas num taxi que carrega os dois amantes pelas noites solitárias da cidade. São estas as imagens (bem sei que mal descritas) que muito contribuem para a minha paixão pela narrativa e estética de Mann. Um olhar arquitectónico pela cidade e sensual pela história.

Se tivesse que fazer daquelas ilações que os críticos gostam de fazer (e lá vou eu fazê-la) eu diria que Blackhat faz parte de uma trilogia "informal" de Mann. Se juntar Colateral e Miami Vice consigo ver os mesmos maneirismos, os mesmos planos, a mesma câmara trémula ao colo do olhar do realizador, as mesmas luzes metálicas ou caóticas, a mesma paixão por seres humanos desalinhados mas impecáveis na sua beleza frágil. Os heróis são homens que constroem barreiras para disfarçar a sua fragilidade, barreiras que voluntariamente deixam cair quando conhecem aquela mulher, seja ela Jada Pinkett, Gong Li ou Wei Tang (será que preciso dizer que estamos sempre a falar de mulheres que não caem no estereótipo caucasiano?). As histórias envolvem sempre violência mas a de Mann não é distante e ascética. Mann aproxima o plano dos homens (sempre homens) e exibe a total e feia força do sangue e da perda. Não existe distanciamento em relação á morte.

Blackhat parece que não anda a fazer muito sucesso pelas bilheteiras mundiais. Provavelmente ter estreado ao mesmo tempo que American Sniper, filme que parece glorificar a violência marcial tão cara aos norte-americanos, não estará a funcionar muito a favor da visão cínica e artística de Mann, um homem que não consegue esconder o belo em cada plano.  Este filme é tudo o que Mann é. Um homem escravo da sua própria linguagem cinematográfica. E eu sou devoto desta religião (desculpem a salada de metáforas).

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