Revenge de Coralie Fargeat

Será que este Revenge de Coralie Fargeat veria a luz do dia anos atrás? Ou, pelo menos, com o formato que acabou por adquirir? Será que esta história de vingança de uma mulher violada seria exactamente assim? Será que necessitamos de movimentos #metoo, feminismos e sufragismos para que a sociedade reconheça o valor destas narrativas? Não falo de valor panfletário. Não falo do valor social. Falo da relevância comercial e artística. Décadas atrás, não passaria pela cabeça de ninguém negar a plataforma narrativa do Cinema a filmes de vingança de Rambos, Comanches e Chuck Norris. Será que precisamos de tanto tempo para saber que, sim, as mulheres também têm lugar neste tipo de filmes? A realidade é que agora começam a aparecer mais heroínas, mais revoltadas, mais protagonistas, em filmes que antes eram de exclusiva província masculina.


Obviamente que antes já existiram várias obras de arte com e sobre mulheres. Anna Karenina de Tolstoy. Sensibilidade e Bom Senso de Jane Austen. Madame Bovary de Flaubert. Alien de Scott e Cameron. Jackie Brown de Tarantino. Mulher-Maravilha de Moulton Marston. Mas, nos últimos tempos, virtude de vários movimentos (ou não),  assiste-se à prevalência de protagonistas que não apenas homens e não apenas mulheres a agir única e exclusivamente à volta de homens. Este Revenge começa por ser uma explosão de testosterona, com homens, armas e uma mulher bonita e sensual, alvo da cobiça pelos senhores à sua volta. Cobiça que advém de uma relação, mas também da exposição do corpo de forma quente. Um dos homens não percebe a diferença entre flirt e anuência e viola a jovem. Segue-se uma tentativa de assassinato e a perseguição implacável, à la Terminator, da vítima aos seus perseguidores.

Não duvidem que este trata-se de um revenge-action-movie ao estilo da velha guarda.  Acção escabrosa. Mortes violentas. Cores garridas. Enredo que desafia a lógica. Mas este código genético não só procura emular velhos filmes de série B ou Z, como também sublinhar a mensagem de castigo a comportamentos ilegais para com mulheres. Um cautionary tale para a era #metoo disfarçado de trash movie. E que grande movie. Divertido, hiperbólico, vingativo. Coralie Fargeat é uma realizadora a vigiar, sem militância, apenas com olho na qualidade artística.

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